O Perigo da História Única

Essa semana, numa aula da faculdade, fomos apresentados a esse vídeo de uma palestra incrível da escritora africana Chimamanda Adichie, que trata sobre o que ela gosta de chamar de história única. Concordo com uma afirmação feita logo no início do vídeo em que a history teller diz o quanto somos vulneráveis frente ao que ouvimos, e não questionamos que possam existir diferentes  histórias para um mesmo assunto, basta mudar a forma como contamos e por onde escolhemos começar.

Quantas histórias únicas nós temos? E se contássemos a história do nosso país pelos olhos dos índios e não dos portugueses que nos colonizaram? “O problema dos estereótipos não é que eles são errados, mas são incompletos.” diz Chimamanda em sua palestra. A história final acaba sempre contada por aqueles que têm mais poder e acabam assim se tornando a identidade definitiva de um povo, o limitando, restringindo-o, fazendo com que este perca sua dignidade e se despersonifique. É o que acontece por exemplo com o Brasil: somos o país das mulheres bonitas, do Carnaval, do samba, da violência e do futebol. Até parece que não somos nada além disso. Ainda temos (ou tivemos) bons escritores, músicos incríveis que tocam MPB, rock, pop, jazz, música experimental, temos boas peças de teatro, boas universidades, gente rica, pobre, boa e má, honestidade e corrupção. Somos tantas coisas e lá fora somos barrados nos aeroportos por carregarmos esse estigma gerado por todas essas diferentes versões de uma mesma história única que há muito é contada sobre nós. O estigma de existirem aqueles que são mais e melhores, e os que são menos e inferiores, é o mesmo adotado por Hitler para justificar seu ódio para com os judeus, por exemplo, e diariamente por todos aqueles que se sentem do direito de oprimir e subjulgar pessoas, povos e culturas, simplesmente por elas terem crenças e culturas diferentes.

Depois de tudo isso ser dito, penso que precisamos renovar o senso-crítico que possuímos enquanto povo brasileiro, e resgatar a educação e alguns valores para essa geração que fazemos parte e as posteriores. Esse é um momento muito particular do nosso país, em que crescemos financeiramente como nunca antes, mas culturalmente falando, permanecemos estagnados no tempo, com uma educação que deixa muito a desejar e nos impede de prosseguir e moldar uma nova identidade. É preciso educar para formar os tipos de homens e mulheres que queremos. Além disso, perceber o quanto é necessária essa mudança, também faz com que nós tentemos olhar o mundo não mais sobre a perspectiva da diferença, mas sim da semelhança. E se contássemos outras histórias que não as que estamos acostumados a ouvir sobre os pobres, os ricos, a escola, os nordestinos, os homossexuais, os árabes, muçulmanos? O que eles tem em comum conosco, o que a mídia e a sociedade escondem sobre esses grupos? O que está por trás do que assistimos na televisão e lemos nos jornais? É importante resgatar esse tipo de senso-crítico, para que possamos andar para frente, ver que existem outras culturas além das muitas existentes no nosso “mundinho” ocidental. Qual é a sua história única?  Conte para nós nos comentários!

Deixo vocês agora com as duas partes do vídeo da palestra de Chimamanda Adichie:

Recomendo: A Invasão Cultural Norte-Americana – Júlia Falivene Alves

Do Estereótipo ao Preconceito

Vivemos em uma sociedade habituada a criar rótulos e estereótipos para enquadrar as pessoas em determinados âmbitos, sejam culturais, sociais, econômicos, emocionais, sexuais, e que constrói esses modelos através de julgamentos excludentes e baseados na negativização. Sendo assim, é necessário que para a existência de pessoas boas, corretas, corajosas ou bonitas, existam antes as pessoas ruins, que agem de forma incorreta, são covardes ou são feias. É um exemplo simples, mas que serve para entendermos quais são as implicações desse tipo de  construção.

O termo “estereótipo” era usado desde 1798 para se referir a uma chapa de metal utilizada para produzir cópias repetidas do mesmo texto na tipografia, significando algo rígido e fixo. Posteriormente, Walter Lippman lançou mão do termo para designar imagens mentais que eram criadas a partir de determinados grupos sociais, com os quais temos pouco ou nenhum contato. Lippman descreveu a criação de  estereótipos como um processo ‘normal’ e ‘inevitável’, inerente à forma como processamos a informação, fazendo assim, uma interposição entre o objeto estereotipado e a realidade.

Apesar dos estereótipos serem ‘normais’ e ‘inevitáveis’, como defende Lippman, a rotulação de indivíduos possui muitos aspectos negativos, dentre eles a viabilização de preconceitos e a limitação de indivíduos. Ao criarmos um rótulo negativo para determinado indivíduo, deixamos de conhecê-lo profundamente, para então formularmos uma representação visual coerente e verdadeira. Desse modo, é importante e necessário observar que todo indivíduo é constituído de diversas ‘faces e, à partir dessa observação, concluir que toda forma de rotulação é falha pois não considera todas as suas peculiaridades; com isso, acabamos utilizando os estereótipos para justificar atitudes de intolerância e exclusão, e nos deixamos levar por determinadas imagens mentais e modelos que se propõem a explicar a realidade, mas diferem da realidade em si. Erramos em tentar reduzir a complexidade humana a imagens simples. Como citou David Hume, em “Investigação Acerca do Entendimento Humano”:

"(...)Todas as cores da poesia, apesar de
esplêndidas, nunca podem pintar os objetos naturais de tal modo que se tome a 
descrição pela paisagem real. O pensamento mais vivo é sempre inferior à
sensação mais embaçada."