Memórias da minha infância racista

Durante muitos anos, se me perguntassem, eu teria dito que nunca fui vítima de racismo.
Talvez seja porque quando a gente pensa em racismo, logo imagina um preto sendo expulso de um lugar chic ou sendo xingado de macaco. Mas sofrer racismo vai além disso, VAI MUITO ALÉM DISSO, e eu explico:

Quando um preto é xingado, constrangido, fica mais fácil reconhecer o racismo e não internalizar os xingamentos. É mais fácil reconhecer que o problema está no racista, não em nós. Dói, eu sei, e tenho muita empatia por cada preto que já ouviu ameaças, xingamentos ou perdeu a vida por sua cor de pele. Mas quem dera o racismo fosse escancarado e não “à brasileira”. Quem dera fosse tão simples identificar quem é o racista e o que é o racismo. Se todo mundo dissesse em alto e bom som que não gosta de nós porque somos pretos, seria questão de entender que simplesmente o problema está no preconceito outro e que não há nada de errado em nós (e claro, processar esses desgraçados). Mas quando a gente é vítima de racismo sem ser, necessariamente, xingado e constrangido escancaradamente, começamos a achar que o problema está em nós. E esse é um lado do qual quase nunca falamos.

A primeira vez que eu sofri racismo eu me senti estranha, mas não pensei, por anos, que tivesse sido racismo. No entanto, ficou a lembrança da primeira vez que eu me senti completamente inadequada sendo como era. Eu tinha por volta de 12 anos de idade, estava indo fazer uma maquete para a aula de história na casa de uma “amiga”. Essa “amiga” era aquele combo da garota perfeita por quem todo garoto tem um crush (eu não lembro qual era o termo que a gente usava na época, em meados dos anos 2000): branca, cabelo liso com reflexos loiros, olho meio verde, umas sardas charmosinhas. E eu, era a sombra dela: a neguinha feia, cabelo ruim preso num rabo de cavalo, mas que era engraçada, boa ouvinte e servia de ponte entre ela e os meninos. As outras meninas do nosso grupo seguiam o mesmo padrão dessa minha “amiga”; todas, sem exceção, tinham cabelos lisos e peles muito claras; entre a confecção da maquete e fofocas, elas elogiavam umas nas outras características que eu não tinha e jamais viria a ter, como olhos claros, cabelos que ficavam lindos em tranças embutidas e que ganhavam reflexos naturais do sol. Eu ficava ali, ouvindo e elogiando, sem esperar elogios de volta. Mas aí, percebendo esse meu constrangimento por estar totalmente excluída da conversa, elas começaram e pegar meus cachinhos que estavam presos e apertá-los. E eu, sem muita reação, fiquei ali ouvindo elas falando do quanto meu cabelo cheirava bem, do quanto era macio, do quando elas não esperavam que fosse macio e gostoso de pegar. Elas faziam isso e eu tentava sorrir e elogiar meu próprio cabelo, enquanto uma voz na minha cabeça gritava “ELAS ESPERAVAM QUE MEU CABELO FOSSE DURO E ESPETASSE A MÃO DELAS, COMO PALHA DE AÇO, BOMBRIL E QUE TIVESSE CHEIRO RUIM”. Mas tudo bem, elas estava sendo legais em me incluir na conversa, não é mesmo? Não era um cabelo bonito mesmo, pelo menos estavam sendo legais ao dizer que era gostoso de apertar. Acho que ainda lembrar disso mesmo quase 20 anos depois dá uma ideia do quanto aquele episódio fez com que eu me sentisse inferior.

Porém, ali começou o tal do incômodo comigo mesma. Eu não entendia que tinha vivenciado um episódio recheado de racismo, pois na minha vida escolar inteira eu havia aprendido que racismo estava relacionado à época da escravidão e que existiam pessoas que xingavam e humilhavam negros até hoje porque não gostavam da cor deles. Eu não tinha sido xingada, humilhada, tinha apenas ganhado elogios racistas, o que eu só viria a entender anos e anos depois. Devia ficar feliz por esses elogios, não é verdade? E entender que o problema estava em mim realmente, já que meus traços não colaboravam.

Foi depois desse dia que eu coloquei na cabeça que pra ser feliz precisava fazer uma escova progressiva. Depois desse dia eu também comecei a querer ser como as minhas “amigas” para ser aceita como elas eram. E não era uma questão apenas de chamar a atenção dos meninos. Eu não tinha autoestima sequer pra achar que chamaria atenção deles. Mas eu percebia que as meninas padrão tinham mais amigos (mesmo as que eram insuportavelmente desinteressantes e infantis), elas tinham mais crushes (enquanto eu era a amiga dos meninos, aquela com quem eles contavam pedindo conselhos, mas não enxergavam “daquela” forma), elas eram convidadas para mais festas, recebiam mais carinho dos professores, dos funcionários do colégio, eram mais populares, os pais dos amigos gostavam delas e demonstravam isso. Enquanto isso, eu tinha muita vergonha dos pais de qualquer amiga de escola, pois era bastante comum que eu fosse vista por pais como má influência para suas filhas, mesmo sendo uma grande nerd que não pegava ninguém.

Claro que ali, estudando numa escola particular a qual meu pai fazia enorme esforço para pagar antes que eu conseguisse uma bolsa de 100%, morando em um bairro mais periférico e com menos acesso a arte, cultura, internet, roupas de marca, as diferenças entre mim e minhas “amigas” não estava somente na cor de pele. E por todas essas diferenças, e pela aparência física, obviamente, eu era constantemente excluída, estava o tempo inteiro tentando me provar, ser melhor, ser mais bonita, aparecer mais, ter mais amigos, tirar notas melhores. No final das contas, o que toda criança quer é sentir que é querida. Meus pais e demais familiares faziam um esforço enorme para que eu tivesse essa atenção, mas sem saberem, eles mesmos, como funcionava o racismo, não tinham como me alertar que o problema não estava em mim. E por anos eu fui convivendo com essa sensação de inadequação. Tive que descobrir sozinha, anos depois, que o padrão de beleza era branco e que essa era a grande razão por trás do mal estar que eu sentia naquele ambiente.

E padrão de beleza branco significa que as pessoas brancas preferem se relacionar com outras pessoas brancas. Elas preferem fazer amizades com pessoas brancas e dão mais atenção e mais credibilidade para pessoas brancas. As demais pessoas, que não fazem parte desse padrão, não são tão interessantes. Não entender como funciona o racismo quando você está inserido numa comunidade racista é terrível. A vida social e escolar de uma pessoa preta que cresce nesse contexto pode se tornar um inferno. E pior do que isso, a criança negra que vive em um contexto branco, geralmente cresce internalizando uma série de preconceitos contra si própria.

Eu não nasci odiando meu cabelo. Não comecei achar minha boca muito grande do nada. Não nasci tímida e nem ansiosa. Não nasci bélica e nem aprendi tantos xingamentos do nada. É difícil escrever sobre isso sem estar motivada pela raiva ou tendo qualquer tipo de distanciamento, mas aí vem a melhor parte dessa história: no final daquele mesmo ano em que fui na casa da tal “amiga” padrãozinho fazer uma maquete, eu fui cancelada. O motivo? Quis ser leal e contar a essa menina que ela estava sendo corna aos 12 anos de idade. E por mais que eu contasse a história com riqueza de detalhes e não tivesse sequer autoestima para flertar com ninguém, fiquei como a garota feia que estava com inveja da loirinha gata e queria roubar o namorado da rival. Patético, eu sei. Mesmo naquela idade, eu achava ridículo brigar por causa de meninos.

Daquele dia em diante, a minha vida escolar de transformou em um inferno. Eu fui excluída de todas as rodinhas, cantavam músicas ofensivas quando eu passava, faziam todo tipo de chacota com a minha aparência e faziam questão de me lembrar que o tal do menino jamais olharia pra mim. Fui obrigada a mudar de turma e passei três anos de estresse constante, enquanto na escola e em casa, tudo era visto como picuinha de adolescente. Minha rotina era andar com medo de que ao pisar em qualquer corredor alguém viesse em meu ataque e me fizesse passar vergonha na frente de novas amizades que construí.

Vocês se lembram do cancelamento da Karol Conká? Eu não consegui compactuar com o cancelamento dela, embora ela tenha errado, porque o meu próprio cancelamento quase 20 anos atrás, me fez aprender algumas lições.

Estar em um ambiente branco sendo uma criança ou adolescente negra, te ensina desde cedo que você não pode errar. Quando você chega em um ambiente racista e começa a se enturmar, é porque as pessoas brancas foram “gentis” em abrir aquele espaço para você, mesmo você sendo tão diferente. Mas, se você dá um passo fora, isso é motivo para que suas “regalias” sejam cortadas, afinal, elas fizeram tanto esforço em te aceitar! Você errou e mostrou que aquelas pessoas eram boas demais e que você não merecia a compaixão delas em te reconhecer como um igual. Você tem zero credibilidade com aquelas pessoas. Agora que você pisou na bola, as pessoas estão autorizadas a te odiar, te perseguir, te desumanizar e serem cruéis. “Paga de gente boa, mas olha quem ela é de verdade!”. A pessoa negra não encontra ninguém para passar um pano. E nunca será desculpada, por mais que o crime dela tenha sido revelar que uma jovem já está sendo chifrada aos 12 anos de idade, em uma conversa privada.

É péssimo lembrar de todas essas situações e saber que essas pessoas se esqueceram. E que hoje vivem suas vidas tranquilamente, possivelmente reproduzindo seus padrões racistas que elas chamam de “mais afinidade”, “gosto pessoal” e  “atração física”. E, se der uma stalkeada nas redes sociais, você facilmente encontra algumas se afirmando antirracistas enquanto posam para fotos ao lado de crianças negras em algum ato caridade.

Pelo menos, quando entendemos um pouco sobre a convivência em espaços racistas, conseguimos nos desprender de muitas coisas que internalizamos. É necessário desprender. E eu me desprendi quando entendi que as situações que aconteceram comigo, não aconteceriam com nenhuma garota branca na escola, por mais que motivos não faltassem.

Ainda existe blogueira que escreve em blog em 2021? Bom, se não existir mais, foda-se!

Eu acho que preciso de um lugar para organizar a bagunça da minha cabeça e, se você quiser acompanhar, vamos lá…

Brasil, 2021. Dois termos que abrigam muitos significados. Tudo isso também tem deixado vocês ansiosos?

Alguns anos atrás li um livro de cartas trocadas entre Caio Fernando Abreu e amigos, incluindo Hilda Hilst e Cazuza.
Muitas daquelas cartas foram trocadas nos anos 70, nos tempos de ditadura. Lembro de ficar assombrada com aquela atmosfera de medo, insegurança, angústia, incertezas. E eu juro que nunca achei que fosse sentir na pele o que li naquele livro. Dói.

Tenho me mantido ocupada e produtiva durante maior parte da pandemia. Iniciei um negócio online do zero, que espero que faça bastante sucesso em breve e não surtei em nenhum momento. Ok, exceto quando pedi demissão. UAU. Mas a melancolia tomou conta de mim, hoje. E eu só consigo pensar que estou presa em um momento horrível para ser jovem no Brasil e querer construir um futuro.

Como nos permitimos chegar a esse ponto e aguentar tudo isso? Sentir o tronco entrar e não fazer nada!
600 mil pessoas morreram! Quando eu escrevo isso, parece ficção. Mas não é, foi real!

Quem vem da classe trabalhadora e não tem casa própria, não está com a vida ganha, é quem mais está sentindo as consequências do verdadeiro caos que tomou conta do país. A impressão que tenho é que estamos sufocando na tragédia, 20 anos de regressão!

E voltando à parte de ser jovem, fico pensando no significa a juventude. Espera-se que os jovens façam planos, que estudem, que viagem, que tenham sonhos. O fascismo é isso: nos tiraram toda a perspectiva…

1984, 1964 ou 2020? Os algoritmos das redes sociais e futuro distópico de hoje

Vocês se lembram de um texto da Chimamanda Ngozi Addichie chamado O Perigo da História Única? Esse texto nos faz refletir sobre como somos formados pelas histórias que ouvimos. Nós entendemos o mundo de acordo com as narrativas que nos são contadas; quando crianças, essas narrativas formam nossos primeiros valores e, futuramente, elas nos fazem ter bagagem para decifrar a realidade que nos cerca. Mas quando misturamos internet, narrativas e algorítimos das redes sociais, o resultado nem sempre é muito bom.

Os algoritmos sabem de todas as nossas preferências, eles conseguem saber todos os nossos desejos, desde os mais sutis, como a vontade de comprar uma bolsa nova, até os mais secretos. E toda vez que você assiste a um anúncio, sabe o que aconteceu antes disso? A empresa que criou aquele algoritmo vendeu suas preferências para a empresa anunciante. Dessa forma, aquela bolsa que você pesquisou o preço e não comprou fica aparecendo em anúncios quando você acessa outra página.

Mas os algoritmos não sabem somente o que você quer comprar. Eles sabem sua orientação sexual, sua faixa de renda, seu estilo de vestimenta, que músicas você ouve, as séries que você mais gosta, se você tem ou não filhos, onde você mora, sua idade e suas preferências políticas. Principalmente, suas preferências políticas. A impressão que temos é de que as redes sociais nos entendem, e assim, elas acabam nos conquistando. Os algoritmos acabam assumindo o papel dos nossos amigos, nos indicando e recomendando coisas que nos interessam o tempo todo. Não precisamos sequer pesquisar, como fazíamos há alguns anos. Será que o próximo passo dos robôs do Google e do Facebook é ler os nossos pensamentos? Aposto que o mercado do Marketing Digital seria um grande entusiasta dessa invenção.

Infelizmente, só agora estamos começando a nos questionar a respeito da influência da Internet sobre nossa realidade e descobrimos algo que deveria ser mais do que óbvio quando pensamos nos bilhões que as redes sociais e os mecanismos movimentam com seus anúncios: quando você usa um serviço gratuito, na verdade, ele não é gratuito, o produto que ele vende é você!

A questão não é sobre nossas preferências serem mercadoria para as empresas que querem nos vender produtos. O problema não é receber anúncios em massa. Os algoritmos têm tido um papel fundamental na difusão de informações e é graças a isso que eles acabam contando histórias que se adequam às preferências de cada pessoa. É a era da pós-verdade, onde basta uma mentira ser contata repetidas vezes, tendo algum elemento de verdade, para que se torne uma verdade.

O algoritmo decide que uma pessoa, por exemplo, receba notícias de jornais sérios e outra, receba Fake News. E é assim que as ferramentas de marketing digital são utilizados para manipular a opinião pública e, obviamente, as eleições. Literalmente filtrando as pessoas por preferências, criando verdades e mentiras personalizadas para cada tipo de pessoa.

Por isso nós, que temos acesso a informações de qualidade, nos questionamos como pode ainda ter uma minoria que parece acreditar em uma narrativa absolutamente desligada da realidade. Esses dias mesmo entrei em uma discussão mais ou menos educada com uma bolsonarista que era médica, e pasmem, acreditava que a melhor forma de lidar com a pandemia seria adotar a imunidade de rebanho e que a bandeira do racismo era desculpa para derrubar o governo, já que os negros tem mais chance morrer pois moram nas favelas dominadas pelo tráfico. E moram nas favelas porque é onde os pobres moram, não devido à resquícios do Brasil escravocrata que nunca reparou os danos causados à população negra que foi escravizada por 400 anos. Tudo “mimimi de esquerdista”.

Infelizmente novamente, é triste perceber como a extrema direita tem domínio sobre a utilização desses algoritmos, desde sempre ligados à conteúdos sobre empreendedorismo. A bolha da esquerda, por sempre ter feito piada e desmascarado esse fascínio dos liberais pelo empreendedorismo, não acessou esses conhecimentos para antever que poderiam ser utilizados para fins golpistas. Vivemos hoje aquele futuro distópico de 1984, em que um governo autoritário controla tudo o que nós fazemos através de uma tela. Nós não percebemos.

O mais triste disso é ver o quanto a manipulação desses algoritmos é capaz de destruir vidas e o futuro das pessoas. Você pega as preferências da Maria José, que ficou revoltada com a corrupção do PT e se sente traída pelo Lula, que está indignada com a cotação do dólar e o preço do combustível, que está com medo de sair de casa sozinha por conta da violência e acha os jovens de hoje em dia não têm mais valores, e vende essas preferências para um governo de extrema-direita, que quer convencê-la de que promover o Estado Mínimo, privatizar, retirar direitos trabalhistas, acabar com ideologia marxista nas salas de aula e armar a população, é a solução para que a Maria José veja um Brasil funcionando outra vez. O algoritmo é utilizado para desinformar, pois fica muito mais fácil vencer eleições com ajuda de Fake News.

E a Maria José passa a vida acreditando que abrir mão dos próprios direitos, que trabalhar sem ter direito a aposentadoria, é a solução para o seu país. Ela é convencida a trabalhar até morrer, por isso diz que é patriota, porque está literalmente dando o sangue para ver o país de volta aos trilhos.

A cidadã Maria José não sabe que a esquerda – essa que sente que só fala para quem está em sua própria bolha – tem um outro projeto de país onde cada vez um número maior de pessoas poderá ter acesso à alimentação, saúde, moradia, educação, lazer, cultura. Tudo aquilo que já nos é garantido pela Constituição.

A esquerda, ou as esquerdas, precisam estudar esses mecanismos e entender como funcionam esses algoritmos. E precisamos questionar também as empresas que estão por trás deles, afinal, elas estão lucrando com a desinformação. Elas são as mensageiras, muito bem pagas, dessa guerra velada e regida por nenhuma lei!

Pitty, a Matriz que há em mim saúda a Matriz que há em você

Eu me lembro como se fosse ontem do momento em que ouvi Pitty pela primeira vez: eu estava em uma festa de aniversário, devia ter entre 11 e 12 anos, e o clipe de Admirável Chip Novo estava passando na MTV. O ano era 2003. Fiquei chocada com aquela música e desesperada para descobrir o nome da artista que estava cantando. Não precisei de muita pesquisa na internet – ainda discada – para descobrir de quem era a música, e uma semana depois comprei Admirável Chip Novo nas Lojas Americanas. Dissequei aquele álbum. Prestei atenção em todas as linhas e entrelinhas do encarte, pesquisei todas as referências que eu encontrei, de Huxley e Orwell a Thomas Robbes, de O lobo. E foi assim com todos os álbuns seguintes. Eu, que nunca fui uma boa colecionadora, comprava com a minha mesada todas as revistas em que Pitty saía para ler as entrevistas, na ânsia de compreender quem era aquela mulher. O recado dela, afinal, me ajudava a entender o meu próprio recado.

E em Setembro desse ano, quase 15 anos após ter ouvido as primeiras canções, fui ao show de lançamento da Turnê Matriz em São Paulo. Um show lindo, ingressos esgotados, um set list com músicas de todos os álbuns anteriores, duas música novas – “Contramão” e “Te conecta”- e uma inédita – “Controle Remoto”, além de participações de Tássia Reis e Emicida, que ajudaram a marcar a noite trazendo mais peso e rebeldia para o som. Estar ali após tantos anos acompanhando de perto, foi mágico. Na fila que virava o quarteirão, encontrei amigos de show que eu não via há anos, todos discutindo teorias sobre o momento atual da banda, alguns muito satisfeitos e outros não tanto, mas todos ansiosos para a noite. E quando o show começou, foi ali na platéia, no meio do bate cabeça, que acessei minha Matriz.

Voltei no tempo, fui parar em uma época em que eu era uma adolescente de 1,50 m que negava toda sua fragilidade. Na fase em que eu fui matando meus heróis e, junto, uma parte da minha essência. Cada nova música do Setlist me transportava para alguma fase boa ou, às vezes, para algum sentimento ou cutucada que a Pitty deu em alguma ferida. Enquanto eu empurrava uns e me defendida de prováveis hematomas, entendi quem eu fui em Admirável Chip Novo, Anacrônico e Chiaroscuro, quem eu ensaiei ser entre o Agridoce e o Sete Vidas, e quem me descobri ao acessar meu verdadeiro eu, ao mesmo tempo em que Te Conecta saía do forno. 

Sempre imaginei o quanto seria incrível sentar em uma mesa de bar com a Pitty e trocar ideia. Hoje não sei o que falaria, se tivesse a oportunidade. “Obrigada”, talvez, por me dar tapas na cara com De Você, me sacudir com Fracasso e dizer tanto o que eu jamais saberia como expressar e, principalmente, por ter essa mente meio perturbada. Brincadeiras a parte, não consigo definir com nenhuma palavra que não “gratidão” o apreço que eu sinto por essa banda ter estado presente e em sincronia com todos os meus momentos. Bons e nem não bons assim. Algumas músicas foram um verdadeiro prumo, capazes de me manter no chão e em mim mesma. Afinal, o que define sua banda predileta não é simplesmente um som da hora, mas conexão. Assim como o que distingue uma intérprete de uma artista é a capacidade de traduzir as experiências humanas em algo palpável, seja num quadro, num livro ou numa canção. E isso, Pitty sempre fez magistralmente.

Talvez ela nem saiba que escrevendo sobre seus sentimentos, dúvidas, constatações, tenha me ajudado (e não só a mim) a desvendar camadas de mim mesma que eu levaria décadas para entender sozinha. Meditação profunda no mais alto nível. Autoconhecimento. Eu aprendi muito cedo com as músicas que eu podia cantar baladas românticas e continuar sendo um ser humano, com as minhas complexidades, falando de assuntos além de relacionamentos. A mensagem por trás das músicas sempre me tocou intimamente. E continua tocando. O show de São Bernardo também foi lindo.

Mude sua relação com o dinheiro e sinta-se mais motivado a poupar!

Ouço muitas pessoas dizendo por aí que dinheiro não traz felicidade, e de certo modo elas estão certas: o dinheiro não traz felicidade, ele COMPRA felicidade! Mas as pessoas tem medo de falar que o dinheiro move montanhas e que elas gostam de ganhar dinheiro. Talvez elas achem que quando uma pessoa ganha muito dinheiro ela obrigatoriamente se torna o tipo de gente que gasta com coisas supérfluas, como investindo num carro caro que você não sai na rua dirigindo pois chama muita atenção ou numa mansão de 30 quartos em que só 3 serão ocupados, deixando os moradores solitários lá dentro. Elas acham que uma pessoa com uma boa quantia de dinheiro é, necessariamente, o tipo de pessoa que só pensa em poder. Enxergar o dinheiro de uma forma negativa é uma das piores coisas que você pode fazer consigo, pois isso poderá te levar a ser uma pessoa sem metas, sem objetivos, que não pensa em ganhar um bom dinheiro nem para realizar seus sonhos.

A mágica com o dinheiro é que ele realiza desejos e possibilita que você adquira experiências únicas. E nem estamos falando de tanto dinheiro assim: com cerca de 15 mil reais você pode passar férias memoráveis na Disney, conhecer alguns países na Europa, ou mesmo tirar férias em família em um resort no Nordeste do Brasil. Com meio milhão de reais talvez você consiga uma casa com piscina para receber os amigos e familiares, dependendo da cidade em que você mora!

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Então, se você acha que dinheiro é algo tóxico, que faz mal, considere começar a dizer que você gostaria de ter dinheiro o bastante para colecionar momentos únicos junto com sua família e amigos. Tente pensar em dinheiro como um  sinônimo de diversão. Para mim, o dinheiro nada mais é do que um meio de garantir experiências e momentos memoráveis com as pessoas que eu amo ter ao meu redor.

Considere que o dinheiro tem a relevância que você dá a ele. Não só o dinheiro, para falar a verdade. Se refletirmos, vamos compreender que as mais brilhantes invenções do homem podem ser negativas se mal utilizadas! Se você utilizar o dinheiro para proporcionar uma viagem incrível à sua família ou alguns amigos, então ele não será uma coisa ruim! Imagine a alegria dos seus filhos ou de crianças próximas a você quando forem chamadas a passar uma tarde na sua casa utilizando sua piscina. Imagine sua emoção podendo assistir a um jogo do seu time europeu preferido no estádio dele? Imagine as histórias que serão lembradas nas reuniões de família e amigos? O dinheiro ganho para viver experiências positivas, nunca te fará algum mal. Só não deixe que o dinheiro mande em você e seja você o responsável pelo valor que o dinheiro tem na sua vida! Tenha sonhos, objetivos, trace metas, poupe dinheiro e realize o máximo de coisas que você puder e, sempre que possível, utilize do seu dinheiro para ajudar a quem necessita!

Não tenha medo do dinheiro e não tenha medo de ganhar seu dinheiro. Procure ser criativo, tenha novos horizontes e não fique achando que a única forma de conseguir dinheiro é com seu trabalho de carteira assinada! Faça freelas, use seu tempo livre para criar seu próprio negócio, tenha novas ideias, leia livros que te ajudem nessas tarefas! E lembre-se: seu dinheiro não terá sido ganho em vão se você estiver pensando na alegria das pessoas próximas na hora de ganhá-lo. E divirta-se no meio do caminho. Não deixe que ganhar dinheiro se torne o objetivo principal. Tenha sonhos e faça seu dinheiro trabalhar para transformá-los em sonhos realizados.

 

Coisas que você deve fazer antes de começar a aprender Inglês ou outro idioma

De acordo com nosso cérebro, nada que nos leva a sentir raiva vale a pena tentar aprender! Se você se obriga a estudar e passa raiva aprendendo uma língua, você está aprendendo do jeito errado. Você já parou para pensar no quanto sabemos absolutamente tudo sobre algo que nos fascina e que quando não gostamos de alguma coisa sabemos pouco a respeito dela? A mesma coisa acontece com os idiomas: fica muito mais fácil aprender uma língua se gostamos dela e eu diria que essa é a única maneira de aprender a falar fluentemente um idioma!

A seguir, listei 5 coisas que você pode fazer antes de começar a aprender inglês – ou de escolher que idioma aprender – para facilitar sua aprendizagem e otimizar seus estudos:

Coisas para fazer antes de aprender inglês_

Dando uma olhada nas dicas, fica muito fácil de entender porque inglês é o idioma mais fácil para nós, brasileiros, aprendermos. Fica muito mais fácil criar uma imersão no idioma mesmo estando aqui no Brasil, pois importamos muitos elementos da cultura norte-americana e inglesa para nosso país. Somos fãs de bandas internacionais, apaixonados por séries que são lançadas no Netflix, assistimos diversos programas americanos na TV a cabo, temos muita vontade de conhecer locais nos EUA, como Vegas, Los Angeles, Miami e Orlando, enquanto muito pouco ou nada sabemos de países da Ásia, da América Latina e da Europa!

Se você vai aprender inglês, você precisa, no mínimo, gostar dos EUA e da Inglaterra! Descubra coisas que você admira sobre o países e sobre as pessoas. Digo isso pois vejo muita gente que aprende por obrigação e detesta os americanos e os EUA, que fala mal dos ingleses. Sinceramente, não dá para aprender inglês desse jeito! Foque nas coisas positivas que existem sobre os americanos, os ingleses, os canadenses e seus respectivos países! Eu, por exemplo, estou buscando a fluência sozinha e tenho me admirado muito com a mente empreendedora dos Americanos!

Para aprender a falar inglês com eficiência, você precisa aliar o seu aprendizado aos seus gostos pessoais. Isso significa que você deve se esforçar para encontrar conteúdo relacionado aos seus interesses em inglês e fazer do seu aprendizado uma forma de lazer e diversão. Gosta de esportes? Passe a acompanhar os esportes gringos! Gosta de cinema? Assista críticas de filmes em canais que falam inglês! E assim por diante!

Lembre-se também que após aprender um idioma você não será mais a mesma pessoa! Aprender uma língua diferente da sua, irá te modificar de diversas maneiras. Pense nas experiências que você terá caso viaje para um país novo que fala tal idioma e como essas experiências mudarão, para sempre, sua vida e quem você! Pense nas coisas novas que você aprenderá estudando um idioma e a cultura local. Não tem como aprender a falar verdadeiramente um idioma sem se identificar com os falantes nativos e sem amar suas descobertas! Por isso, vá fundo e não tenha vergonha de aprender e dizer que ama a língua que você aprende a pelo menos um dos países que fala o idioma!

Espero ter ajudado com dicas realmente úteis para seu aprendizado de idiomas! Se esse texto te ajudou de alguma forma, peço que você compartilhe com amigos que estejam em dificuldade de aprender uma língua ou que estão pensando em começar a aprender!

 

HIV? Conheça o canal do Youtube que vai te ajudar a ver o vírus com outros olhos!

O medo da AIDS passou e a falta de prevenção fez com que a doença voltasse a crescer entre os jovens brasileiros. Mesmo que esse assunto seja batido, que todo mundo saiba que deve-se usar preservativo, muitas pessoas ainda têm dúvidas sobre como o vírus pode ser transmitido, o que fazer se você for exposto a uma situação de risco, sem falar sobre o preconceito que sofrem as pessoas portadoras do HIV. Muitas pessoas não sabem, por exemplo, que não se pega HIV ao beijar uma pessoa soropositivo e nem que existe uma grande diferença entre HIV e AIDS!

É sobre esses temas e mais um pouco que fala Gabriel Estrela, um portador do vírus HIV no canal chamado Projeto Boa Sorte! O canal tem, atualmente, 22 mil inscritos e o Gabriel Estrela já conversou por lá com várias criaturas da internet como Jout Jout, Regina Volpato e até Wanessa Camargo! É um canal que recomendo tanto para portadores quando não portadores do HIV!

 

 

Bibliotecas no Booktube? Será que está faltando falar delas?

Olá, pessoas!

Ontem saiu um vídeo no canal no qual eu mostro pra vocês três livros que peguei emprestados na biblioteca de São Paulo e faço uma breve discussão sobre a ausência de bibliotecas no Booktube!

Pra quem não conhece o termo, Booktube é um nicho do Youtube no qual as pessoas falam apenas sobre livros. Tem diversos canais literários lá, cada qual com seu foco, mas o que todos têm em comum é: nunca mostram bibliotecas! E eu sinto falta disso!

Dê sua opinião: você gosta de ir a bibliotecas? Acha que os canais no youtube poderiam incentivar mais as bibliotecas?

 

Extraordinário e o Capacitismo!

Extraordinário estreou hoje no cinema e, infelizmente, não pude estar lá na estréia. Esse foi um livro que, desde que terminei de ler, quero ver uma adaptação para o cinema e vou assistir assim que eu puder!

O livro, escrito pela autora R.J. Palacio e publicado aqui no Brasil pela editora Intrínseca, vai mostrar a jornada de um menino de 10 anos, chamado August Pullman, que é portador de uma anomalia genética que fez com que sua característica mais notada fosse o rosto: Augie tem várias deformidades no rosto e as pessoas se assustam perto dele e o evitam pois se sentem desconfortáveis ao terem que olhar para ele. Mas Auggie não é apenas a deficiência dele! Ele é um garotinho incrivelmente inteligente, que como qualquer outra criança, está ansioso para seu primeiro dia de aula na vida, aos 10 anos de idade!

Apesar de mostrar uma história de superação – coisa que deixa muita gente enfurecida – o livro tenta mostrar para as pessoas como o capacitismo não faz sentido e machuca quem sofre com ele. Capacitismo é o nome dado à discriminação que os portadores de deficiência sofrem diariamente. Ser capacitista é tratar a pessoa com deficiência como inferior, como incapaz, como coitada e, também, como exemplo de vida e superação – afinal, esse é o único lugar que cabe a essas pessoas.

No livro vamos perceber como se sente esse personagem, que mesmo criança, já é vítima de tanto preconceito. Como temas centrais desse livro temos a inclusão, o bullying, a educação de crianças com deficiência, o papel da família na formação do portador de deficiência, a falta de preparo da sociedade e das escolas para lidar com deficiência, além da falta de orientação para o convívio saudável entre pessoas portadoras e não-portadoras de deficiência.

É um livro que, sem dúvidas, você deve ler. De preferência, antes de ir no cinema assistir ao filme!

 

Livros com personagens gays!

Se existe uma coisa que eu gosto na vida é de ser surpreendida por livros.

A Literatura LGBT – termo com o qual eu discordo – tem crescido muito e trazido alguns títulos incríveis! Nesse gênero literário você vai encontrar protagonistas homossexuais que irão dividir com você seus dilemas, seus pontos de vista e suas histórias!

Nesse vídeo eu mostro para vocês três livros LGBT que tive o prazer de ler esse ano e que tenho certeza que vai te deixar querendo ler mais livros recheados de inclusão e personagens cativantes!

Relacionamentos Abusivos? Venha conhecer Amor Amargo, um livro que vai te levar ao limite das suas emoções!

Depois de muito tempo venho aqui contar para vocês que criei um Canal Literário no Youtube! No vídeo dessa semana, falo de um livro Jovem Adulto que, apesar de falar com um público jovem, traz um tema extremamente tenso e importante: relacionamentos abusivos!

Nesse livro vocês irão se chocar com a história da Alex, uma jovem de 17 anos, que se torna vítima de violência doméstica!

Inscrevam-se no canal, porque garanto a vocês que vídeos novos com conteúdo super legal estão sendo preparados e tenho certeza que ninguém vai querer perder!

Algumas reflexões feministas

Antes de sequer pensar na palavra “feminista” como definição, eu já era bem feminista. Imaginava que, se aos 16 anos eu era madura o bastante para ter responsabilidades e rotinas de um adulto, como sair cedo, cumprir obrigações e voltar pra casa no horário de pico, poderia ser considerada madura o bastante também para ser dona de mim mesma, decidir sobre o meu corpo, sobre minhas escolhas afetivas e para ter o controle sobre minha sexualidade. E foi então que decidi encontrar um ginecologista que pudesse me deixar mais segura em relação a essas questões e descobri que muitas adolescentes não têm esse direito: ao invés de médicos, muitas vezes encontram fiscais de seus corpos. Foi o que aconteceu comigo.

Eu estava cansada de sofrer com cólicas infernais, com as alterações de humor que eu já não suportava, queria saber que tipo de distúrbio me afetava, se eu tinha algum problema, aprender a lidar com meu corpo em mudanças e, quem sabe, resolver as inseguranças que eu tinha por não saber como lidar com meu próprio corpo. Queria começar a tomar pílula anticoncepcional, já havia lido na internet sobre interromper o ciclo menstrual, mas todas as minhas expectativas foram frustradas quando entrei no consultório de uma médica de postura absolutamente machista e tradicionalista. Era a ginecologista que minha mãe frequentava há anos.

No consultório minha mãe teve que me autorizar a entrar sozinha na sala da médica. Eu tinha passado a noite anterior sem dormir, inclusive, listando tudo o que eu queria saber. E lá fui eu, confiante, apesar de bastante envergonhada, pensando que resolveria uma parte da minha vida naquele dia. Contei para a médica sobre as cólicas,o ciclo irregular, perguntei sobre a possibilidade de pílula anticoncepcional, porém tudo para a ~doutora~ não passava de frescura. Como eu, adolescente, poderia perder o tempo dela com minhas dúvidas idiotas? Eu nem dona do meu próprio corpo era. Tudo era normal: as cólicas e o ciclo irregular eram parte do fardo que eu deveria enfrentar até a menopausa porque Eva mordeu uma merda de uma maça. Eu deveria me conformar. Sexo na minha idade, então? Nem pensar. Minha sexualidade foi absolutamente tratada como tabu, como se sequer existisse.

Sozinha numa sala impessoal, com uma estranha tomando propriedade do meu corpo e me julgando, me senti coagida a mentir sobre diversos pontos e fui embora frustrada, me achando uma hipocondríaca e nunca mais voltei a médico nenhum até bastante tempo depois. Quando voltei, foi para descobrir que aquela médica me deu diagnósticos completamente equivocados.

O corpo feminino é extremamente complexo, todas as semanas passa por mudanças e isso acaba refletindo diretamente em nossa auto-estima e na maneira como lidamos com a nossa sexualidade. Naquela ocasião, fui embora me sentindo extremamente culpada e amedrontada. É assustador não saber o que se passa consigo e achar que você pode ser punida por exercer sua sexualidade. E pior não poder falar sobre virgindade, sobre sexo, com o profissional que deveria nos proporcionar segurança e informação a respeito desses tópicos, afinal, eles fazem parte do leque de assuntos mais relevantes durante a adolescência.

Por isso, hoje eu busco ao máximo lidar com profissionais que não me vejam como uma incubadora e não objetifiquem meu corpo e minha sexualidade. Infelizmente, a maioria dos profissionais da ginecologia não se diferenciam dessa doutora e de tantos médicos que frequentei e acabei sentindo que perdi meu tempo. E sei que, embora preservativos sejam distribuídos em qualquer UBS, a amplitude dos métodos contraceptivos é negada a muitas adolescentes simplesmente porque há péssimos profissionais responsáveis por lidar com a saúde íntima feminina. Há despreparo da família, dos médicos, das escolas e tudo contribui para que sejamos reféns de uma estrutura machista e arcaica. 

Se esses médicos tratam adolescentes como se elas não tivessem direito à sexualidade ou como se sua sexualidade fosse um erro porque precisam ir em busca de métodos contraceptivos ainda muito jovens ou porque engravidam, obviamente não serão bons profissionais para lidar com a saúde das mulheres adultas. Nas salas de parto ainda insistem em fazer episiotomia sem que a mulher ao menos possa consentir ou ser avisada e nos consultórios médicos acabamos entupidas de remédios sem saber as causas das mazelas que afligem nosso corpo. 

Somos conduzidas a procedimentos traumáticos, a cesarianas desnecessárias, a remédios que vão tratar sintomas e não causas, sem que nos seja oferecida qualquer alternativa. E, o mais preocupante, é que para que tenhamos acesso a profissionais qualificados prontamente, temos que desembolsar. E nunca sai barato o que deveria ser gratuito e de acesso a todas nós.

Filme da semana: E se eu ficar (2014)

Estou me desafiando a assistir um filme por dia até o final do próximo ano. Será que consigo? Se serão 365 filmes assistidos, não garanto, mas, como acredito que conhecimento não compartilhado não serve para coisa alguma, toda semana irei dividir com vocês aqueles de que mais gostei. Há tempos não escrevo sobre filmes e livros favoritos. Isso deve mudar.

Por recomendação de um amigo assisti a um filme que você não deve assistir sem uma caixa de lenços ao lado. Você vai chorar! Chama-se Se eu ficar. Lançado em 2014, o filme foi baseado no livro de mesmo nome, escrito pelo autor Gayle Forman e terá uma continuação, pois o segundo livro da série, Para onde ela foi, já foi lançado.

Fazem parte da trama a atriz Chloë Grace Moretz como Mia Hall e Jamie Blackley como Adam Wilde. Na história, Mia é uma jovem de 17 anos que toca violoncelo, enquanto Adam é o vocalista de uma banda que está se destacando e começando a fazer sucesso em Portland. Os dois se apaixonam, mas tudo muda quando Mia sofre um acidente trágico que mata toda sua família. Então, em coma, ela busca reviver os momentos de sua vida enquanto decide se irá acordar ou não.

Comecei a ver o filme pensando que seria mais um blá blá blá de adolescente, mas acabou me surpreendendo. Primeiro porque os atores são mais profundos do que parecem, depois porque o filme não segue uma linha cronológica firme, o que causa muita tensão e expectativas: ficamos ansiosos para saber o que acontece com Mia após o acidente e somos impedidos pelos flashbacks. A trilha sonora também é sensacional e um dos momentos mais incríveis é a cena em que os personagens fazem uma versão de Today, do Smashing Pumpkins.

Fiquei inclusive com vontade de ler os livros, apesar de ter lido críticas dizendo que o filme acaba sendo melhor por causa da trilha sonora. Mas quero saber o que irá suceder na segunda parte da história. O final me deixou muito ansiosa. Nesse fim de semana também revi “Amizade Colorida” e “Borat”, dei muitas risadas e o filme faz uma crítica espetacular!

Suicídio assistido

Durante essa semana muita polêmica foi levantada com a notícia de uma norte-americana de 29 anos que cometeu um suicídio assistido após descobrir um câncer no cérebro que a tornou uma doente terminal. O procedimento é liberado em alguns poucos estados americanos e foi a escolha da moça. Após colocar em prática sua lista de “Coisas para fazer antes de morrer”, ela morreu confortavelmente em sua cama, ouvindo suas músicas prediletas e ao lado das pessoas que mais estimava.

Por outro lado, há pessoas que não estão doentes, mas morrem lentamente em vida. Não arriscam, não quebram regras, não contradizem a si mesmos sem sofrer por dias com a culpa. Não viajam sem planejar por meses, não reciclam as ideias, se acuam diante do novo. Outras passam por cima da ética, da justiça e de si mesmas para não bater de frente, para manter a ordem e a conveniência. Gente que teme suas próprias emoções e é escrava de convicções baseadas em uma porção de regras inventadas. Gente que não subverte, não petisca, não muda nunca. Gente que se enfadonha de si mesma.

                          As melhores lembranças surgem das piores ideias.

Se regras e o controle são necessários, a loucura também o é e já sabiam disso os religiosos cristãos na Idade Média. A Festa dos Loucos, evento que fazia parte do calendário cristão, reunia três dias de loucura, vinho, e tudo mais “para que a insensatez, que é nossa segunda natureza, e inerente ao homem, pudesse se dissipar livremente pelo menos uma vez ao ano. Barris de vinho de tempos em tempos estouram se não os abrimos para entrar um pouco de ar.”. Sabia-se que a loucura era necessária para manter a ordem quando a ordem fosse essencial.

E voltando ao tópico do post, me soa paradoxal esses tantos julgamentos feitos a respeito da decisão tomada pela norte-americana de encerrar sua própria história, de ser condutora de sua própria jornada em rumo ao seu próprio destino ao invés de aguardar sua hora escrita nas estrelas. O suicídio em doses homeopáticas de apatia e conformismo diante da vida e de nós mesmos me soa ainda mais grave. Não estamos doentes, afinal.

A (não) sexualidade da mulher

Sou feminista porque, dentre outros motivos, a vida inteira fui e vi mulheres sendo tratadas como seres sem sexualidade. Parece que foi ontem que eu, em meus quatorze ou quinze anos, frequentava a escola e me sentia excluída das aulas de biologia destinadas à uma ~tentativa~ de orientação sexual. Nessas aulas nunca  ouvi temas relacionados ao orgasmo feminino, à masturbação feminina ou nada que tivesse relação com a libido que as garotas presenciam na adolescência tanto quanto os garotos. O clima era tenso e a sensação era de que aprendíamos minimamente sobre sexo para temer sexo. Os garotos não. Eles podiam falar de bronha, era feita vista grossa quando eles tomavam viagra e ficavam exibindo seus membros sob a calça de tactel do uniforme escolar e levavam escondidas suas revistinhas pornográficas. Nunca ouvimos palestras sobre consentimento, mas nós, meninas, sempre ouvíamos instruções sobre o quão perigoso era andar desacompanhada, sobre o quão preocupante era nossa relação com álcool e todo aquele blá blá blá sobre culpabilização da vítima mulher que todo ser do sexo feminino conhece. Entre minhas amigas, a maioria de criação machista, um mero absorvente interno era tabu. Temia-se que um O.B. fizesse o hímen se romper, como se este, oras, fosse patrimônio do homem que “tiraria nossas virgindades”, afinal, a sexualidade feminina para poder se afirmar, precisa ser descoberta através de um homem. Ser lésbica, jamais. Siririca, nem pensar.

Ontem, durante meu momento de procrastinação, resolvi dar uma pesquisada nos temas que circulam sobre “Saúde Feminina” no Yahoo Respostas e acabei horrorizada com a quantidade de meninas sem qualquer orientação sobre temas que deveriam ser banais. Garotas de 13, 14, 18 anos assustadas com probleminhas femininos que facilmente seriam solucionados por uma visita de 15 minutos a um ginecologista e uma receita de pomada inofensiva e indolor. Ou que, às vezes, nem são problemas, são apenas nosso corpo. Deixam de ir ao médico por medo, vergonha, culpa, por temer represálias da mãe, por falta de autonomia sobre seus próprios corpos. São essas meninas que engravidam cedo por falta de orientação e prevenção adequada, ainda que tenham acesso à internet. Garotas que, como eu e muitas amigas, saíram horrorizadas da primeira visita ao ginecologista por termos nos sentido absolutamente constrangidas a responder perguntas quase inquisitórias como: você já fez sexo? usou preservativo?, nos fazendo sentir que transar fosse algo muito errado, como se valesse mais a nossa idade do que nossa maturidade para iniciar a vida sexual. Ignora-se a sexualidade feminina para evitar ter que lidar com ela. Se os médicos, que deveriam estar preparados para lidar com o quesito educação não estão, quem então estará?

Esses são apenas alguns exemplos do quanto à mulher é negado o direito de acesso ao próprio corpo, à sua autonomia e sexualidade. Acontece a negação desses direitos a cada vez que vamos ao médico por uma simples dor de garganta, pegamos a receita de um antibiótico, e o médico nem sequer nos informa que pode haver interação com a pílula anti-concepcional, porque nossa sexualidade é invisível e problema nosso se ocorrer uma gravidez indesejada: “na hora de dar foi bom, não? Se tivesse fechado as pernas!”. Acontece toda vez que abrimos uma revista destinada ao público feminino e fala-se tudo sobre sexo menos o primordial: que é impossível aproveitar o sexo sem antes aproveitar a si mesma e sempre que vemos um pornô e foi desenvolvido para o público masculino. Brochamos. Ocorre sempre que mulheres que não se adaptam à anti-concepcionais hormonais procuram ajuda médica para encontrar um outro método eficaz e não o conseguem porque os valores são inacessíveis e o Estado não os provê. A mulher não tem sexualidade para a indústria pornográfica e nem para o Estado.

Precisamos romper essa redoma de silêncio. Dialogar com as amigas, fazer verdadeiras excursões às Sex Shop espalhadas por aí sem medo de sermos felizes, descobrir a literatura erótica esquecida nas estantes das livrarias É necessário cessar a invisibilidade que se inicia no momento que temos o nosso lado mais genuíno apagado por uma cultura machista. Se, por um lado, somos vítimas desse tipo de construção, por outro, podemos e devemos utilizá-la a nosso favor como um meio de empoderamento da mulher e do ~universo feminino~. Escrevi esse texto por mais Oficinas de Siririca acontecendo por aí e pra que, em um futuro não tão distante, nenhuma mulher sofra slut-shaming por usar um O.B. ou tenha que se ocupar com os fiscais de sua (não) sexualidade.

 

 

 

Assisto e recomendo: O Negócio – Série Nacional no HBO

Aproveitando a noite de sábado, passei aqui para fazer algo que há séculos não fazia: recomendar uma série nacional incrível chamada O Negócio. Criada por Luca Paiva Mello e Rodrigo Castilho, a série estreou em agosto de 2013 e agora está em sua 2ª temporada, causando muita polêmica e recheada de cenas quentes.

A história conta sobre três mulheres, Karin, Luna e Magali (Rafaela Mandelli, Juliana Schalch, Michelle Batista), que buscam dar uma guinada em sua profissão. Acontece que as três são garotas de programa e, em meio ao caos aéreo de São Paulo, dão início a uma carreira de muito sucesso.

O que me chama a atenção na série é ver a prostituição sendo tratada por um ponto de vista ao qual não estamos acostumados: as profissionais são mulheres seguras, donas de si mesmas, que não adentraram o mundo da prostituição devido a qualquer tipo de opressão. Elas querem dinheiro, querem independência, e a prostituição nada mais é do que sua forma de empoderamento.

No mais, a produção é muito bem feita, provando que o Brasil é capaz de criar entretenimento genuíno, de qualidade e encontrar um público assíduo e fiel.

Metáforas…

Esquecer um amor que te machuca, se livrar de um sentimento que te corrói é como uma cirurgia. No início a ideia assusta e, depois, a cicatriz pode doer por um tempo. Mas, provavelmente, abrir uma ferida e arrancar de dentro o que há de errado é o que irá te salvar e garantir que os próximos anos possam ser vividos.

Namorado de Aluguel

Recentemente me chamou a atenção nas atualizações de uma colega em uma rede social um compartilhamento de um tal de “namorado de aluguel”. Um pouco desacreditada, sem saber muito o que esperar do assunto, abri o link para ver do que se tratava e lá estava: era um rapaz que vendia seu tempo livre por R$100,00/hora e se propunha a sair com mulheres para “emprestar” sua companhia. Dizia no anúncio de seu site que aceitava convites para jantares – desde que a anfitriã pagasse -, tardes assistindo comédias românticas de pijama na sala, que seria capaz de conversar sobre todo e qualquer assunto, de colocar a moça para dormir, e, cereja do bolo, topava inclusive sair nas fotos do álbum de casamento daquela amiga que convida a mulher constrangedoramente para seu casamento.

Fiquei desorientada. Primeiro porque não tratava-se da venda de sexo, prazer, algo a que já nos habituamos, e sim de um “namorado de aluguel” vendendo seu  tempo e sua atenção. Depois porque parece que finalmente estamos nos tornando vítimas das nossas próprias criações, conectados até enquanto dormimos mas criando relações humanas cada vez menos íntimas e sólidas, tanto que estamos começando a ser seduzidos pela ideia da compra e venda de carinho e atenção, algo que sempre tivemos gratuitamente e de bom grado. Após uma breve pesquisa, descobri ainda que hoje pode-se contratar namorados de mentira via Mercado Livre e especializados em causar ciúmes e despertar a inveja nas redes sociais através de sites que fazem pacotes de acordo com o número de comentários amorosos que se deseja nas redes e que vêm fazendo o maior sucesso.

Se por um lado pagar por uma boa companhia garante uma troca de experiências honesta difícil de se encontrar por aí, por outro  parece triste depois do combinado simplesmente assinar um cheque e voltar para casa com a solidão de companhia. E eu diria ainda que a solidão não é um problema, que ela é necessária e importante, que todo mundo deve aprender com ela doses de amor próprio e pilulas de auto-conhecimento e que invejável mesmo é ser bem resolvido. Dane-se se todas as amigas estão pensando em se casar no próximo ano, se todo aquele pessoal do colégio hoje está começando a ter filhos. Enquanto se fica para titia a gente planeja uma viagem, improvisa.

No mais, toda mulher com R$100,00 por hora disponíveis para gastar provavelmente prefere investir em roupas, pares de sapatos, perfumes e bolsas. Estes ainda duram mais do que uma boa companhia – paga.

Bates Motel

Acordou naquela manhã com o céu ainda nublado invadindo o quarto. Tudo era impessoal, mas, ao mesmo tempo, parecia tão familiar que ela sentia que era parte de tudo aquilo.

Quando abriu os olhos o viu ainda dormindo e reparou que as mãos dele a prendiam, de forma que se mexendo o acordaria também. Ficou o observando. Aquele homem estranho e sua barba, e seus traços que faziam uma bela combinação entre si, mas que ela não sabia se eram bonitos em si. Ela acariciou aquele rosto, passou a mão naqueles lábios, ajeitou aquele cabelo.

“Se existem duas coisas que eu não gosto posso apostar que são galãs e gente dentro da caixinha!”, pensou.

Ele não era galã e muito menos dentro da caixinha. Era humano e imperfeito, não aquele estereótipo de gente feliz e descomplicada. Era cheio das idiossincrasias que ela gostava de achar graça observando a si mesma. Ela também gostava de observar suas roupas e a forma como mesmo engomadinho ele se destacava da multidão de engomadinhos. E exercia uma espécie de fascínio sobre aquele cara estranho, de feição séria, que convencia a todos menos a ela. Adorava ele almofadinha e ele perdendo a cabeça e abrindo o coração.

Se aninhou com ele na cama e mesmo seus movimentos mais singelos o acordaram. Se abraçaram e ela gostava daquele abraço como gostava de nenhum outro lugar no mundo. Cada toque dele tocava também a alma. Não era sexo, era ópio. Lícito, mas ainda assim, ópio.

Voltaram a dormir os dois. Ela mais sã e certa do que nunca e ele… Bom, ele era ele.

 

Sobre desconstruir e se lembrar direito

Defini que esse seria o Novembro do desapego. Mês de Finados, por que não também o mês de enterrar tudo aquilo que não mais acrescenta? Finalmente arrumei os armários, me desfiz de uma porção de roupas que apenas ocupavam espaço, reorganizei prateleiras, excluí pastas e arquivos do computador, joguei fora diários com confissões antigas, cartas de ex-namorados, minha coleção de esmaltes vencidos e na hora de me livrar de você, percebi que ainda te queria.

Queria com todas suas incongruências, com seus defeitos, com suas manias, seu olhar, sua risada estranha, seu cheiro, seu toque, sua pele. E me arrependi absurdamente quando limpei a lixeira do meu notebook com as nossas fotos. Passei horas me perguntando se você ainda as mantém guardadas em algum lugar e se olha para elas sorrindo. Ouvi todas as músicas animadas que aguentei, mas repousei nas tristes. Cantei declarações de amor que nunca fiz, pensando que eu podia dar um jeito de aparecer na sua porta enrolada numa toalha e te amarrar na cama, de um jeito selvagem porém ainda com algum humor, pra nos transformar em paixão, em loucura, suor e suspiros.

E nós fomos isso, não fomos? Ainda que tenhamos sido apenas uma pequena epifania ou uma grande inconsequência? Porque você não me olha nos olhos e diz que signifiquei pra você? Ou me olha nos olhos pra simplesmente dizer que eu sou uma maluca, que idealizo demais, que levo tudo muito a sério, que você não suporta minhas esquisitices, que odeia uma porção de coisas em mim e que te fiz mais mal do que qualquer bem?

Fiquei pensando no seu silêncio incômodo, na chance que você me deu de criar mil hipóteses a ponto de eu nem saber mais o que é mentira ou verdade entre nós. Repeti os conselhos clichês que sempre ouvi dos amigos pra colocar de uma vez por todas na cabeça que você nunca se importou de fato. Que me faltava reviver nossos momentos com outros olhos, enxergar os fatos como foram e não como eu gostaria que tivessem sido. Que tudo nunca passou de um teatro ensaiado, de uma diversão sádica pra satisfazer a sua síndrome de Napoleão, sua necessidade por massagem no ego.

E esse texto é sobre não gostar de quem se gosta. É sobre achar que nunca vou me acostumar a nunca poder confiar. É sobre traições que vão além da carne. É sobre sentir-me tola por ainda acreditar no poder da sinceridade, das coisas que fazemos por paixão e verdade, por ainda falar em honra e caráter. É sobre finais e recomeços, sobre nunca aceitar menos do que se merece. “Abrir os olhos era o que bastava. O coração mente e a cabeça usa truques conosco, mas os olhos veem a verdade.”.

Um brinde aos sincericídas

Luiz Fernando Guimarães interpretou para a televisão o “Super Sincero”.  Na série, o personagem faz rir dizendo o que todos nós pensamos, porém não temos coragem de dizer, sendo, assim, taxado de grosso. “Se você mente, então é chamado de mentiroso. Agora se você é sincero e fala a verdade, dizem que você é grosso”, afirma. O personagem é aquilo que eu costumo chamar de “sincericída”.

Há tempos penso no limite para a sinceridade, sempre fico com o meio termo. Obviamente existem as mentirinhas do bem, aquelas que usamos para não causar climas inconvenientes, e que não fazem nenhum grande mal a ninguém. Mentir que está tudo bem, quando você não quer falar por que motivo tudo anda mal. Dar um sorriso ao chefe para não atirá-lo escadaria abaixo, e manter o emprego do qual você necessita. Se calar no calor de uma briga e não falar tudo o que vem à cabeça para evitar o arrependimento depois. Viver sem essas pequenas fugas é inevitável, mas o tema de hoje nesse blog é o papo furado.

Imaginem o mundo se as pessoas dessem menos voltas para chegarem aonde querem. Talvez você tomasse um susto, claro, com alguém te dando uma má notícia sem se cercar de alguns eufemismos, mas talvez você agradecesse por aquele aprendiz de cafajeste não te iludir pra te levar para a cama. Talvez o tal do cara também fosse chamado de pervertido por algumas, mas aposto que economizando o tempo de ludibriar moças para conseguir algo mais, o resultado seria mais sexo em menos tempo. E a melhor parte? Você ter a chance de evitar se apaixonar pela ideia de um sujeito maravilhoso que vai deixar de existir após a segunda manhã de sexo, e ele ainda reduz as chances de ser chamado de canalha por alguma desavisada.

Um pouco mais de sinceridade talvez te trouxesse menos amigos, mas com toda certeza te livraria daquele colega chato que adora desperdiçar seu tempo contando vantagens e falando de assuntos que pouco te interessam. O fato é que ninguém merece papo furado. Papo furado do namorado, do amante, do ficante, do amigo, do político, do chefe, do advogado, do réu, da consciência.

A sinceridade não é apenas uma relação entre nós e os outros. É, primordialmente, uma relação entre nós e nós mesmos. Sinceridade é agirmos com a nossa alma, ainda que isso nos leve a agir de outro modo que não aquele que esperam de nós. Ser sincero consigo é eliminar pesos, é se afastar de pessoas e atitudes que não nos levam além, é deixar de acreditar nas mentiras que contamos a nós mesmos.

Um brinde aos sincericídas! A praticidade de um sincero pode te assustar, mas pelo menos te livra do blá blá blá.

Sobre acreditar em Deus e acordar sem olheiras

Se eu acreditasse em Deus, todas as noites antes de dormir eu pediria: “Senhor, me livre de toda cagação de regra! Amém!” e então adormeceria o sono dos justos. Mas, como eu não acredito, antes de dormir tento pensar em pelo menos meia dúzia de coisas impossíveis se tornando realidade.

Imaginem, senhores, que agradável seria o mundo se as pessoas utilizassem o bom senso. Que incrível seria se desejassem “bom dia”, “boa noite”, “obrigado”, se dissessem “por gentileza”, “com licença” e pedissem desculpas. Imaginem que paz teriam nossos narizes se tomassem banho antes de dividir os espaços públicos, não exagerassem nos perfumes, se cada um cuidasse do seu próprio hálito. Imaginem como viveríamos menos estressados se todos tratassem bem o telemarketing, se o carro da frente desse seta, se os fones de ouvido fossem regra e não exceção nos ônibus, se não invadissem o espaço e a privacidade alheios, se não necessitássemos de tanta urgência.

Imaginem quantas conversas agradáveis e edificantes teríamos se todos assistem menos televisão, lessem menos Veja e comprassem mais livros. Imaginem todos preocupados com suas vidas e, por isso, julgando menos, se respeitando mais, não se matando por tudo ou nada.

Imaginem que bacana poder sair na rua à qualquer hora do dia ou da noite sem temer um assalto. Imaginem mulheres podendo usar roupas curtas no verão sem receber cantadas baixas, buzinadas de carros, andando sozinhas à noite sem temer que qualquer olhar de um estranho acabe em um estupro.

Imaginem podermos fazer nossas escolhas sem ter que ouvir a opinião do Papa ou do Silas Malafaia. Imaginem a comida gostosa na festa de casamento daquele casal gay que há anos planeja juntar as escovas de dentes e assinar os papeis. Os transexuais sendo tratados como gente, sendo chamados por seu nome social. Imaginem gordos e magros, altos e baixos, bonitos e feios sendo tratados com o mesmo valor, dignidade e respeito. Imaginem os negros e os pobres não sendo criminalizados e mortos por suas origens. A periferia descansando ao menos uma noite em paz.

Imaginem os sistemas operacionais funcionando. As filas andando. O trânsito fluindo. A nossa paciência sendo economizada.

Pois é, senhores. Eu dormiria mais rápido se acreditasse em Deus.

Destinatário e remetente

Um dos meus maiores desejos sempre foi ter o poder de transformar em sentimentos bons todas as mágoas e dores dentro de mim. Eu sempre quis desenvol ver meu desapego, não desperdiçar minhas energias cultivando raiva e desamores. Eu sempre quis confiar no destino, confiar no tempo, nas linhas tortas por onde caminho. Secretamente sempre acreditei que pessoas entram e saem de nossas vidas por algum motivo. Mística.

Eu sempre quis acreditar que o que tiver que ser, será. Que talvez não seja agora e nem nunca mais. Mas que talvez seja amanhã ou depois, numa esquina, num esbarrão, seus papéis caindo, eu me desculpando, nossos olhares se cruzando, a conversa surgindo e o tempo se arrastando até que um de nós tenha que partir e a gente tenha vontade de reviver o que deixamos para trás. Utópica. Romântica. Sonhadora.

Pessoas passam por nós e nos deixam marcas, fazem trocas, deixam manias, lições, reflexões, saudades, cheiros, memórias. Depois se vão, mudam a escala de importância que ocupam em nossos dias, saem do foco de nossas prioridades e nos deixam alguma sensação de perda. O tempo encarrega-se de gerar o balanço do que foi bom ou ruim, de reorganizar os espaços, de preencher os silêncios, de resgatar os sentidos.

É o amor buscando se livrar do ódio para virar amizade ou transformar-se em indiferença.  É a amizade tentando se livrar do amor pra voltar a ser somente amizade. É o rancor sendo obrigado pelo tempo a se dissolver nas alegrias. É a amizade tirando o espaço da mágoa para crescer mais forte. É o tempo separando o joio do trigo, nos mostrando os reais anseios, subtraindo as expectativas e colocando no lugar as verdades sentidas. O vento apagando e reacendo o que for para ficar.

“Medo que dá medo do medo que dá…”

Renato Russo colocou em palavras uma realidade do meu cotidiano: “Todos os dias antes de dormir, paro e penso como foi o dia.”. É nesse momento que penso nas minhas tantas incertezas, em minhas certezas tão mutáveis e pego no sono tentando responder as retóricas em minha cabeça. São tantas contradições e paradoxos, tantos medos e tantos atos de coragem, tantas cobranças e tanto descompromisso, que me faltam estruturas para organizar tudo em pensamentos coerentes. A coerência me foge o tempo inteiro.

Eu tentei ser coerente com as minhas escolhas, ser coerente nos meus amores, com a minha escrita, mas descobri que meu maior compromisso é com a vida. É ela que eu quero valorizar, é sobre ela que não quero ter a sensação de que deixei para trás. Eu posso carregar o peso de saber que fui incoerente e contraditória, mas não o peso de que fiz da vida algo que não gostaria. Eu aguentaria a culpa por magoar qualquer pessoa, menos o fracasso declarado por mim mesma me dominando a cabeça. Eu aguentaria me contradizer dia após dia em todas as crônicas e pensamentos que publiquei, mas não o peso de permanecer presa a uma ideia que não sou eu.

Vivo com essa necessidade constante de saber cada dia mais quem eu sou e o sentido de estar presa nesse universo, com a jocosidade de ser alguém entre outras bilhões de pessoas. Vivo achando que devo fazer algo de muito útil, de muito extraordinário, de muito inovador. Vivo pensando que talvez eu precise de respostas para as perguntas que ninguém faz, precise enxergar por ângulos que ninguém olha.

Afinal, “será que não temos tempo a perder” ou “temos todo o tempo do mundo”?, qual é o limite que separa a nossa coragem da covardia?.

E sei é que preciso aproveitar melhor o meu tempo, é que minha vida precisa parar de existir apenas depois que saio do trabalho e cumpro minhas obrigações. Minha vida deve começar no instante em que acordo e não ser vã no momento em que desligo. E sei que a coragem de viver minhas escolhas e colocar em prática as imagens que circulam em minha cabeça, não significam a ausência do medo. A ausência de medo é burrice. Negar o medo é negar a existência humana. Coragem talvez signifique que existem vontades, sentimentos, lugares a se conhecer, planos para concretizar, que são mais grandiosos que nossa gana por controle. Coragem é desapegar, ainda que doa. Coragem é se entregar, mesmo que sofra.  Coragem é saber que algo é maior que o nosso medo.

* Título faz parte de Medo, música de Lenine e Julieta Venegas.

Se eu te escondo a verdade, baby, é pra te proteger da solidão…

Detesto falar de amor, ou melhor: detesto falar de amor usando clichês para resumir tudo aquilo que já se pensa sobre o assunto.

Os filmes românticos acabam sempre com os mesmos finais e, na vida real, se você não tomar cuidado, inevitavelmente vai começar a dizer pelos quatro cantos que o amor é uma merda! No final das contas, amar pode até ser uma porcaria, mas a grande merda mesmo é o amor romântico!

O amor romântico é fadado à frustração, é uma causa falida! Vivemos no século da individualidade, da solidão, mas continuamos a acreditar que somos incompletos e que precisamos encontrar nossa outra fração. Idolatramos o amor romântico e todo o resto se torna banal. Creditamos ao outro nosso tesão, nosso orgasmo, nossa insônia e até nossa alegria. Mas está tudo na nossa cabeça. Quem adivinharia? Não seria muito mais proveitoso se, ao invés de depositar nossos anseios no outro e darmos a ele o peso da nossa felicidade e bem estar, nos responsabilizássemos por nós mesmos? Porque perdemos tanto tempo com a insegurança, com o ciúme, limitando o outro a viver só para nós, como um pássaro preso na gaiola?

O amor moderno precisa se adaptar à individualidade e se voltar para o crescimento pessoal dos indivíduos que formam um casal. Precisa abandonar a ideia de posse e apostar no companheirismo, na cumplicidade e no respeito verdadeiro pelo outro se quiser fluir. Precisa abandonar a ideia de que o amor é uma espécie de mágica que automaticamente acaba com os problemas, os vazios, as melancolias. O amor romântico é uma frustração porque inexiste sem a insatisfação, o desrespeito e porque fecha as portas às novidades, à vida, tornando-se fadado ao tédio e ao comodismo.

Amores modernos e, principalmente, sadios não combinam com dependência emocional. Amores são sobre diferenciar  precisar e querer. Quero estar com alguém por vontade, não por necessidade e me sinto no direito de exigir essa reciprocidade de sentimentos. Amar é também sobre deixar o outro sentir sua falta, é sobre deixar o outro ser. A maior prova de amor é duas pessoas que poderiam estar fazendo qualquer outra coisa de suas vidas, que conseguem viver plenamente bem sozinhas, estarem juntas por vontade… Todo o resto é uma desonestidade!

Mas dói, né? Seu ego ao perceber que você não tem tanto controle assim sobre a vida de alguém?

Outro dia mesmo falei sobre me livrar dos pesos e eu não quero ser a responsável pelas frustrações de ninguém. Talvez seja por isso que tenho aprendido com a solidão a gostar mais de mim, buscado ser mais feliz sozinha e tenho conseguido me sentir inteira, completa. E eu vou te amar porque eu quero, porque eu não preciso!…

Sobre encontros…

Que sentido faz a vida? Essa jornada confusa e tão paradoxal? Nós nascemos sozinhos e morremos sós, sonhando a vida inteira em preencher os espaços com alguma dose de amor, aconchego e da vida que as horas, por vezes, nos arrancam. Vida essa que me cobra cautela e calma, quando o que eu mais quero é o imediatismo. Vida essa que se faz em dias ensolarados, em mesas de bar cheias de amigos e conversas de horas que terminam com a sensação de que deveriam durar toda uma eternidade… Banhos de chuva, amores, dores, alguns pileques pra depois rir à toa.

Vida essa cheia de pessoas com um único desejo comum: o de preencher os vazios da existência.

A vida é um parto. Parto-me.

Vida essa que me desespera, que me torna cada dia um pouco mais ou menos otimista…

Tenho tentado me livrar dos pesos, das pessoas que nada me acrescentam, dos amores vagos, dos sabores amargos e me cercar apenas de tudo o que me faz bem. Tenho tentado não fazer do ato de sair da cama um grande drama. Tenho preferido ler bons livros e dar boas risadas, a gastar minha energia me tornando mais amarga e deprimida. Meu mantra de meditação tem sido o “foda-se”. Repito o tempo inteiro.

Fodam-se os caretas e os caga-regras. Fodam-se os patrulheiros da vida alheia. Eu quero os encontros de alma, os corajosos, os que não têm medo de dar grandes passos e cair grandes quedas. Quero aqueles feito bonecas russas, que sempre guardam mais dentro de si mesmos do que transparecem aos olhares desatentos. Quero gente me que olhe nos olhos, me agarre na nuca e não tenha medo de ser invadida!

Vida essa reticente. Que não sabe como começa e só acaba quando termina.Um jocoso trocadilho…

Solidão acompanhada

Era sempre a mesma sensação, o mesmo incômodo doído no peito, aquele vazio… Era culpa da existência aquele buraco ali aberto, precisando ser preenchido, a fazendo se sentir incompleta. “Segunda opção”, “deposito de porra”, “capacho” eram algumas formas como ela às vezes referia-se à si mesma com desprezo. Como poderia ter uma auto- estima tão pequena e uma certeza tão grande de que merecia algo bom de verdade? Como podia odiar tanto suas falhas e, ao mesmo tempo, se achar muito mais incrível e até se passar por prepotente por se achar tão especial? Contradições.

Ela se distraia com os caras com quem compartilhava o tesão, aquela infíma parte do seu desejo, a ponta do iceberg. Vivia numa espécie de satisfação sexual que não sabia se lhe fazia mais bem ou mal. Gozava com alguma facilidade duas ou três vezes, e depois sentia que uma solidão a acompanhava a preenchia. Sexo é subestimado, pensava. Talvez fosse mais proveitosa uma siririca bem tocada a uma foda que lhe cansava os músculos e depois doía a alma.
Fato é que sentia que havia muito mais para dar de si do que apenas a boceta e achava tudo aquilo um desperdício de tempo, energia, sanidade. Pensava no quanto aqueles seres desnudos ao seu lado perdiam e no quanto ela mesma, em sua liberdade sexual que a taxava de biscate, retraia um pulsar incessante no âmago. Sentia sede de intensidade, de entrega, coisa que socar algumas vezes aqui e outra ali não sanava.
Levantou-se daquele cômodo impessoal de motel, colocou a calcinha jogada na ponta da cama e vestiu as roupas enquanto saía de fininho. Deixou o rapaz dormindo. Na maioria das vezes aquelas fodas filosóficas lhe pediam uma caminhada e um cigarro com gosto de câncer e cool. Culpa cristã era o caralho. O buraco era mais para dentro e sangrava.

Notas musicais: Bárbara Eugênia ♪

Recentemente me flagrei ouvindo coisas que nunca havia imaginado. Eu, que era assumidamente do rock, dos clássicos, me peguei ouvindo também os clássicos do samba, os grandes nomes da MPB, as novidades incríveis do Rap.

Então esse ano na Virada Cultural de São Paulo, com uma programação completamente distinta das edições passadas em mãos, vi com um amigo um show incrível do Criolo, que ficou ecoando na minha cabeça por semanas e acabamos por ver a Bárbara Eugênia, meio que por falta de algo melhor pra fazer (eu sendo sincera) e eu simplesmente me apaixonei, assim, à primeira vista mesmo. A voz limpa mesmo entre os cigarros, o batom vermelho e o sorriso enigmático e sedutor no canto dos lábios da cantora bastaram para que ela ocupasse as primeiras posições entre as músicas mais ouvidas no meu player em poucos dias. Vi inclusive mais um show após o primeiro, coincidentemente, o lançamento de seu segundo disco, “É o que temos”, que traz uma versão impecável do clássico “Porque brigamos?”, canção dos tempos de minha avó.

Journal de BAD é o primeiro lançamento da artista, e meu favorito.

Carioca, mas Paulista, Bárbara Eugênia canta sobre desilusões amorosas e amores, com uma pegada retrô e empolgante. Edgar Scandurra gravou as guitarras de seu disco e também o produziu. O resultado foi um daqueles discos que a gente escuta também com a alma.

Sobre Pensar e Permanecer na Zona de Conforto

Ignorância é uma bênção, sempre afirmei. Ignorância é cômodo. Incomodo é pensar, porque leva a querer tomar atitudes e, novamente, agir não é cômodo.

Pensar me dá burburinhos na alma, me indigna. Quando leio um bom livro que coloca em cheque minhas verdades inabaladas, então, sai de perto. São dores de cabeça, músicas revoltadas no talo do meu ouvido e até uma vontade incontrolável de não segurar as lágrimas de revolta que me brotam volta e meia.

Ser pensante não é confortável, já me fez inclusive abrir mão daqueles amores fáceis. Vivo naquele dilema do “é bonitinho, mas…”. Mas é machista, mas é homofóbico, mas é reacionário, mas é alienado. Nunca dá certo. Ser pensante já me fez querer saltar pela janela do ônibus nas diversas vezes em que fui obrigada a ouvir conversas quase surreais e os absurdos que as pessoas trazem em suas mentes comuns. Ser pensante é perigoso.

Por mais prazeroso que seja aprender a olhar por outros parâmetros, ser pensandte e inquieto na cabeça é perder o direito àquela ignorância gostosa que nos permite assistir à televisão sem pensar em mais nada. Ah… aquela ignorância que não me permite ir dormir pensando nas notícias que li no jornal e das mazelas do país.

E o pior sobre ser pensante, é a sensação de impotência. A sensação de ser só mais um que não sabe se é esperto ou burro por querer nadar contra a maré mesmo sabendo que quando precisar pagar as contas e dar a cara a tapa sozinho, vai sentir aquela câimbra inconveniente e se deixar levar pela correnteza.

A ignorância é a bênção pela qual rezo todos os dias antes de dormir.

A mulher e o medo

Em 1949, ano em que foi lançado o livro O Segundo Sexo, uma célebre frase transformaria sua autora, Simone de Beauvoir, em um ícone do feminismo: “Não se nasce mulher, torna-se”. Com essa frase Simone, filósofa existencialista, quebrava o estigma de que as mulheres tinham um destino biológico já formulado, tirando-as dos papéis socialmente estabelecidos para elas, que eram obrigatoriamente o casamento e a criação dos filhos, ou então, o magistério. Em sua obra, a autora se propôs a traduzir o que significava ser mulher, dizendo que “A mulher determina-se e diferencia-se em relação ao homem e não este em relação a ela; a fêmea é o inessencial perante o essencial. O homem é o Sujeito, o Absoluto; ela é o Outro”.

Em termos práticos, o que Simone de Beauvoir queria dizer é que desde os primeiros passos a mulher recebe uma série de restrições e uma educação que a coloca em desigualdade para com os homens. Enquanto as mulheres crescem procurando se adequar à vaidade deles para que possam encontrar bons maridos e, assim, adquirir uma posição em seu universo extensamente mais interessante, os homens estão livres para alçar voos maiores, pois já são os donos desse espaço que elas tanto almejam. Enquanto os homens desperdiçam seu tempo livre como bem entendem, as mulheres estão ao lado das mães aprendendo as tarefas do lar, como pregar botões e seduzir seu homem pelo estômago.

Embora muitas mudanças culturais e comportamentais tenham ocorrido nas últimas seis décadas, a obra de Beauvoir ainda continua clara e atual, nos mostrando a história de opressão que a mulher sofreu e ainda sofre. E mesmo com tantos avanços, não são poucos os exemplos dessa herança paternalista e machista que carregamos. A mulher convive diariamente com medo e com a dualidade de escolher viver a sua vida e fazer suas próprias escolhas, assumindo todas as consequências cruéis que daí podem surgir, ou seguir todas as regras e ser recompensada por fazer aquilo tudo que se espera que uma mulher faça. Se assumir como ser humano dotado de imperfeições e desejos, muitas vezes, requer que a mulher dê sua cara para bater, que tenha coragem, que tenha discernimento para não sucumbir às diversas agressões que sofrem, que vão desde insultos não muito criativos à surras para que se ponham em seu devido lugar. Atire a primeira pedra a mulher que nunca foi chamada de “vadia”, “puta” ou adjetivo pior e aquela que nunca ouviu entre as amigas histórias de agressões que foram parar numa delegacia, num hospital ou numa cova. É só abrir o jornal.

Tudo isso me faz questionar porque tem sido tão difícil livrar as mulheres dessa carga cultural, porque ainda precisamos do feminismo e porque as lutas que vivenciamos parecem infinitas. Não posso culpar as mulheres pela opressão que elas sofrem, assim como seria inviável culpar os negros pelo seu passado de escravidão e os judeus por terem sido vítimas do holocausto. As mulheres, assim como outras minorias, tornaram-se, em grande parte, machistas porque acreditam nas enormes recompensas de se apropriarem do discurso do opressor, porque não têm parâmetros para conduzir sua própria liberdade.

A liberdade da mulher é uma eterna desconstruções de padrões e conceitos que foram firmados por uma vida inteira.A liberdade da mulher passa pelo questionamento do padrão de beleza que as condiciona, pelo fim da liberdade sexual somente quando convém aos interesses masculinos, pelo exercício da empatia e da sororidade com outras mulheres. E até a liberdade, há um longo e árduo caminho.

Recomendo: Veias Abertas da América Latina

Eduardo Galeano tem sido sinônimo de gênio para mim desde que comecei a ler Veias Abertas da América Latina. É um livro imprescindível, deveria ser obrigatório nas escolas e pra qualquer pessoa que deseja conhecer mais a fundo a história de seu país e continente e entender de quais maneiras a colonização invasão europeia influencia nossa cultura, nossa organização social e os problemas que nos impactam atualmente.

O livro é interessante, nos mostra uma perspectiva histórica que não aprendemos com os livros da escola. Temos uma visão muito mais clara e menos romântica ao ler as constatações do autor, que, ao contrário de autores didáticos, não maquia as opressões pelas quais passaram os nativos habitantes da América, os negros, as mulheres e as classes oprimidas pelo capitalismo em suas diversas fases. Por vezes, as palavras irônicas e duras do autor doem como um tapa na cara.

O autor nasceu em Montevidéu nos anos 40, se tornando um dos grandes jornalistas e escritores do Uruguai. Foi perseguido pela ditadura militar em seu país e foi obrigado a se exilar na Argentina e Espanha, tendo sido incluso na lista do esquadrão da morte e caçado por seus ideais socialistas e revolucionários. Escreveu em 1971 sua mais conhecida obra, Veias Abertas da América Latina e esta parece atemporal, nos fazendo entender melhor tempos de protestos, de mídias compradas e sujas, de governos que fazem desapropriações e matam moradores das favelas.

Para desvendar os mistérios da extração do ouro e das misérias.

Livro disponível em PDF.

A Primavera Brasileira tem mais festa do que fúria

Empatia significa apropriar-se do sofrimento do alheio, mas pode ser definida também como um exercício diário que a gente pratica sempre que se dispõe a sair do nosso mundo e mergulhar no universo do outro. Mas o problema com a empatia é que ela anda em falta e não é fácil cria-la diante daquilo que não é tão óbvio. Empatia é tomar para si a revolta de uma mãe que perde seu filho em um assalto, mas também é mais do que isso.

Em uma palestra muito acertada, o escritor Mia Couto já afirmava que é preciso quebrar as barreiras do medo e passar a conhecer aqueles que por décadas nos acostumamos a chamar de eles, mas o problema com a empatia é que chegamos a um grau tão alto de violência em que não conseguimos mais enxergar humanidade no outro, naquele que vive uma realidade diferente da nossa.

Vivemos em uma sociedade que todos os dias exclui, segrega e mata, estratificada de tal forma a satisfazer apenas o interesse de uma dúzia de senhores que concentram quase a totalidade dos bens produzidos pelo país e define quais devem ser as aspirações da classe média que os sustenta. Sociedade essa que criou um monstro chamado Desigualdade Social e com o qual até hoje não sabe lidar e nem faz questão de saber.

E por que estou dizendo isso? Porque é da Desigualdade Social que nasce o menor abandonado, o morador de rua, o sem-teto, o analfabeto funcional, o colarinho branco, a fome, a chacina. O monstro chamado Desigualdade Social contribui para o aumento da criminalidade, para o tráfico de drogas, contra os quais o cidadão de bem quer lutar, mas sem saber, alimenta. Porque o monstro sucateia escolas, hospitais e bens públicos, mas a classe média que pode optar pelo privado não sofre nem se comove com isso. Porque o mostro Desigualdade Social está diretamente ligado ao desenvolvimento das cidades e esse trânsito caótico, essas favelas que não se incendeiam sozinhas e esse transporte público que não funciona.

A lógica sempre me disse que quando uma pessoa possui muito é porque falta algo a alguém, e que isso se aplica a tudo. Se um grupo ostenta mais privilégios, é porque a outro falta direitos e riquezas. Se há concentração de bens e serviços em determinada região, é porque em outra há carência de infraestrutura. Se há especulação imobiliária e as casas se tornam cada vez mais caras enquanto há quem more em condomínios luxuosos, cercados de câmeras, grades e proteção, é um tanto óbvio que isso criará moradias irregulares, ocupações, favelas e pessoas vivendo em situação de extrema pobreza.

E o que me choca mais é estarmos tão inertes a ponto de estarmos protestando por inúmeras causas, algumas válidas e outras não, mas sem entender a fundo a gravidade dos problemas do nosso país. Será que estamos mais uma vez tentando curar os sintomas sem nos preocuparmos com a doença? Até quando vamos fingir que não vemos a opressão que sempre esteve presente na periferia insone  e que, de diversas formas, nos atinge também? Se me preocupo com essas questões é porque não vejo sentido em uma sociedade que faça bem apenas para mim e uma pequena parcela de sua população. Não me interessa privilégios, me interessa igualdade, para que nem eu nem ninguém precise se preocupar mais em resolver o que fazer com os delinquentes, com a falta de bons hospitais públicos, o não cumprimento das leis. Me preocupo porque é o mínimo que eu poderia fazer, porque fazer protesto seguindo cartilha de bons modos e obediência civil só incentiva os donos do poder a tapar o sol com a peneira para acalmar os bobos.

E diante dessas minhas constatações só posso concluir que esse gigante sonolento, criado a leite com pera e revista Veja não pode ir muito longe a não ser que deixe de defender os interesses da minoria e passe a caminhar rumo à destruição de monstros que ele próprio criou. A grande maioria das pessoas não entendeu o que são esses protestos. A maioria não descobriu como ser empático o bastante para não defender apenas seus próprios privilégios. E não me chamem para essas micaretas conservadoras de ideais elitistas e direitistas. Me chamem para uma revolução de verdade, me chamem contra a opressão do pobre e do desfavorecido, mas não pra essa patifaria com teor de carnaval. Não é revolução de verdade se não houver luta de classe, se não for subversivo o bastante para entrar nos livros de história e nos sonhos da juventude. ““Se Não Posso Dançar Não é a Minha Revolução” Emma Goldman

“Guerra é Paz, Liberdade é Escravidão, Ignorância é Força.” George Orwell, 1984.

Mas nós, que sonhamos com a liberdade, a justiça e o respeito, não somos cidadãos de bem…

No início desse ano (re)assisti a uma peça de teatro que me marcou muito: Luís Antônio – Gabriela. Um espetáculo sobre respeito, inclusão e, acima de tudo, humanidade, palavra essa muitas vezes esquecida quando simplesmente aceitamos colocar pessoas e outros seres em condição inferior à nossa. A peça fala sobre um rapaz transsexual obrigado a entrar no mundo da prostituição para sobreviver em plena ditadura militar, mostrando os abusos que sofreu, a discriminação, o rompimento com a família e a vida que levava à margem da sociedade. Luís Antônio, ou Gabriela, como era conhecida, morreu em 2006 já muito debilitada pela aids e pelas complicações de seu estilo de vida; era uma figura grotesca: um homem com seios e coágulos de silicone industrial acumulados por suas pernas, o que causava grande dor e desconforto. Sucesso de público e crítica, a peça termina com um grande momento de lucidez e reflexão, com os atores cantando Your Song, do Elton John, após uma fala emocionante de Luís Antônio: “a vida é tão curta e eu vou ficar me doando pela metade?”. Luís Antônio só sabia retribuir amor e compaixão, não fazia distinção entre seres humanos, para ele, totalmente dignos de respeito, carinho e compreensão. “Para quê eu vou dar uma mão, se posso me doar de corpo inteiro?”, ele se perguntava. Assisti a peça duas vezes, sempre enxugando as lágrimas no final, com esperança de mais igualdade, respeito, compaixão entre as pessoas, que fosse muito além de religiões e interesses políticos, gritando dentro do peito…

As indiferenças diárias, o descaso, a omissão, os preconceitos e violências sofridas pelas minorias desse país me doem. Sinto que sangro toda vez que presencio o ato de tapar o sol com a peneira, tão comum nesse nosso país. Sofro toda vez que me lembro que na nossa sociedade, escrever essas coisas como escrevo, é quase um ato de subversão: nós, que sonhamos com direitos humanos, com progressos reais e para todos, com respeito e dignidade, somos os vilões da história. Ser cidadão de bem no Brasil é lutar para manter os privilégios daqueles que não os merecem!

Parece que estamos cada vez mais distantes de conquistar um país verdadeiramente independente, laico e humanista. Perdemos a nossa humanidade, inevitavelmente, toda vez que naturalizamos formas de violência, que discriminamos, que negamos ao outro direitos e liberdade para ser e existir, que não conseguimos o enxergar com a alma que enxergamos em nós mesmos. Perdemos nossa humanidade, nosso espírito democrático e nossa dignidade ao aceitarmos Marco Feliciano e Bolsonaro na Comissão de Direitos Humanos.

 

 

Luís Antônio – Gabriela: Uma peça sobre diversidade e humanidade

Nesse domingo, fui com um amigo rever a peça Luis Antônio – Gabriela, escrita por Nelson Baskerville, eleita pelos críticos da APCA como a melhor de 2011. Durante a apresentação, tudo o que eu conseguia pensar era que o mundo seria muito mais humano e agradável se todas as pessoas a assistissem. O espetáculo conta a história de um travesti que sofre por assumir sua transsexualidade em plena Ditadura Militar e, mais do que uma lição sobre a aceitação da diversidade e a quebra de papéis de gênero, é uma lição sobre humanidade, amor e generosidade.

luis antonio

Maltratado pela vida, saindo de casa aos dezesseis ano e obrigado a entrar no mundo da prostituição para sobreviver, tendo acabado em Bilboa, na Espanha, onde veio a falecer em 2006, aos 53 anos, já muito debilitado pela Aids e  os efeitos das injeções de silicone, Luís Antônio jamais perdeu a alegria de viver. Ele falava sobre a entrega a vida, sobre distribuir amor às pessoas, sobre a generosidade. “A vida é tão curta e eu vou ficar me doando em pedaços?”, ele dizia.

Na plateia do teatro lotado havia pessoas de todos os gêneros, idades, sexualidades e estilos dando risadas, se emocionando e possivelmente imaginando um mundo onde a felicidade, a diferença e o gozo do outro, não sejam capazes de incomodar ninguém. Me levantei da poltrona ao término ainda com lágrimas brotando dos olhos, e após aplausos intermináveis e calorosos, voltei para casa sonhando com um mundo de mais amor e menos julgamento.

Com o fim da temporada em São Paulo, no teatro Alfredo Mesquita, em Santana, a peça irá viajar por várias capitais do Brasil. Para quem é de SP e não conseguiu ver a tempo, também há o livro recém-lançado por Nelson Baskerville, que além de contar a história de seu irmão Luís Antônio – Gabriela, traz também o roteiro da peça.

“O Riso dos Outros” e a Caretice no Politicamente Incorreto

Manhã de sábado quente e eu resolvi escrever sobre um tema já falado aqui antes: o humor. Depois finalmente arrumar algum tempo para assistir ao documentário “O Riso dos Outros”, com direção de Pedro Arantes, algumas falas dos participantes me deixaram com vontade de falar mais sobre o assunto aqui. Mas antes de tudo, gostaria de dizer que o documentário foi muito bem dirigido e que faltava mesmo um bom posicionamento acerca do tema vindo de quem tem realmente visibilidade na mídia, já que os blogs contemplam um público muito seleto.

Afinal, o humor precisa ou não ter limites? É negativo ser politicamente correto? O humorista precisa ter noção sobre a responsabilidade social de suas piadas? Devemos proibir piadas sobre determinados assuntos? Essas foram algumas das perguntas feitas pelo documentário e que geraram argumentos muito interessantes, mas lendo os comentários de alguns telespectadores no youtube, percebi que ainda é difícil para algumas pessoas entender porque é complicado fazer piadas com negros, mulheres, judeus, homossexuais, estupro e que há muita gente que crê na “patrulha do politicamente correto”, que acha que é uma caretice imensa se indignar com piadas do gênero, revelando um pensamento no mínimo paradoxal.

o riso dos outros

É um tanto óbvio que o humor tem a função de fazer rir sobre o que há de torpe e caricato na sociedade, e que, sendo assim, ri com os preconceitos já existentes, não necessariamente criando preconceitos novos. O problema é que o riso gerado nesses casos, serve para perpetuar o que já se pensa sobre o assunto, enaltecer o câncer que é o senso-comum e não há nada de transgressor, inovador e revolucionário em falar o que já vem sido dito por décadas. Sinceramente, não entendo a graça de ser politicamente incorreto e defender que as mesmas piadas continuem sendo feitas com minorias que lutam diariamente para que sua realidade possa ser mudada. Isso é ser careta, reacionário, conservador, acreditar que privilégios precisam ser mantidos para um seleto grupos de cidadãos merecedores, enquanto os outros devem ter seus direitos negados e ceifados. Há algum aspecto positivo em ser uma dessas coisas? Acredito que não.

Por outro lado, fazem uma confusão imensa com o ser estereotipado de “politicamente correto”. “Ah, é o fulano que não acha graça em nada”, “É o certinho sem graça”, “É um careta, vive no sáculo passado”. Não faz sentido, são ideais controversas e paradoxais. O politicamente correto é justamente o oposto disso, é aquela pessoa cansada de viver por décadas em uma sociedade que não desfaz seus preconceitos, que exclui as mesmas minorias, e que é revolucionário e transgressor o bastante para se posicionar contra o que o senso-comum acredita que é o correto e natural, e cobrar mudanças. Não há nada de errado em ser politicamente correto e é preferível ser considerado um desses chatos a ser um “normal” totalmente adaptado a uma sociedade esquizofrênica e doente!

Na minha humilde opinião, caricato e torpe é que ainda existam pessoas que consideram negros inferiores, que se preocupam e são contra a sexualidade do outro, que creem na incapacidade das mulheres, que acham muito legal fazer piadas com judeus que foram dizimados e carregam um sofrimento terrível em sua história. O problema não está no tema da piada, mas no alvo da piada. Como foi dito no documentário “”O melhor tipo de humor é o que faz a gente rir do carrasco, e não da vítima…”, não porque devamos escolher novos alvos de discriminação, mas porque é necessário um humor que faça pensar.

A arte de nunca ancorar…

Final de ano chegando e todos, inevitavelmente, começam a se fechar e fazer balanços de tudo de positivo e negativo que ocorreu no ano. É o momento em que  nos desprendermos de uma série de coisas e pessoas que, muito embora tenham  nos viabilizado uma porção de experiências e momentos incríveis, cumpriram seu papel e precisam ir embora. Um verdadeiro ciclo shivariano: coisas novas vêm ocupar o lugar das antigas num processo de renovação e desapego.

E é essa sensação de encerramento de mais um ciclo que venho tendo com o início das despedidas do Agridoce, que até o fim do ano não terá novas apresentações e deve retornar no início de 2013 para seus últimos shows – tudo muito incerto ainda.

Talvez o projeto paralelo tenha ganhado tanto destaque por ter gerado um dos discos mais belos e sinceros do último ano. Um disco para refletir sobre questões profundas, sem pressa – com aquela calma das conversas na sala de casa, acompanhadas de uma garrafa de vinho. Um álbum que é uma unidade viva com ritmo e essência próprios, que revela suas nuances, texturas, experimentações, ironias e entrelinhas ao longo do tempo.

O surgimento de possíveis novos trabalhos para Pitty, Martin e banda é animador para a maioria, mas traz um misto de felicidade e saudade antecipada aos que compreenderam e se identificaram com o projeto paralelo que revelou outros lados de uma mesma Pitty,  muito mais madura e ousada, capaz de se desvincular de cobranças externas  e se reinventar através de um disco acústico, mantendo sua essência. Quem prestou atenção sabe, está tudo ali: a mesma compositora, as mesmas inquietações, a mesma jocosidade e o espírito guerreiro, hedonista e “pé na porta” presentes desde sempre.

O Agridoce proporcionou a seus fãs o maior privilégio que poderia: a possibilidade de fazer com que alguns se apaixonassem a segunda vez pelos mesmos artistas. Uma conquista digna de românticos que, com verdade e honestidade, nutrem sua relação, cativando, apesar de alguns desentendimentos, a mesma pessoa diariamente.  O Agridoce me ganhou com a possibilidade de redescobrir a mesma compositora que ao escrever sobre si e seus anseios, indiretamente escreve sobre mim e tantos outros e me seduziu mostrando a extensão do talento de um guitarrista que tocando violão, fez com que incríveis composições ganhassem vida e fizessem ainda mais sentido.

Se o Agridoce se despede, ainda com a saudade, desejamos que Pitty continue mestre na arte de nunca ancorar.

Gente negra, parda, miscigenada e linda!

Recentemente, li uma pesquisa sobre o racismo muito entristecedora, que revelava o quanto o preconceito se manisfesta nas crianças. Segundo o estudo (que você pode ler clicando aqui), crianças negras e pardas são muito mais rejeitadas na escola do que seus colegas brancos, manifestando na adolescência problemas como a insegurança e a falta de auto-estima, traços que acabam se perpetuando pelo resto de suas vidas.

Os motivos dessa discriminação desde a infância são vários. Além de aprenderem observando o comportamento dos adultos e interiorizarem a rejeição àqueles que não fazem parte do seu convívio (no caso de crianças que não convivem com pessoas negras), as crianças desde sempre aprendem que o padrão de aceitação é o europeizado. Seus ídolos da música são garotos brancos da elite que falam de corações partidos, os heróis dos desenhos que passam na TV não são negros, mas as empregadas nas novelas quase sempre são. Na escola, essas crianças aprendem desde cedo qual é a sua posição no mundo, a de subalternos.

Embora não seja comum presenciar pessoas pregando o ódio, a perseguição, inferioridade contra algum negro, o nosso racismo existe e é um racismo velado; fomos ensinados a não admitir nossos preconceitos, a existência de desigualdades inadmissíveis e a presença de minorias, culpa daquela velha e tacanha lógica que nos faz acreditar que só há fogo quando há fumaça, que ao ignorar nossos problemas eles automaticamente deixarão de existir. O Brasil é um país racista e que acredita não ter racistas. O racista brasileiro é aquele que costuma fazer declarações dizendo “não tenho nada contra, mas… eu não gostaria que minha filha se casasse com um rapaz negro”, “nada contra, mas… tenho que confessar que a maioria dos negros pobres são bandidos”, isso quando não ri de piadinhas racistas que escuta por aí. “Está na moda ser politicamente incorreto, esse povo chato e metido a besta é que adora chamar os outros de reacionários!”.

O exemplo mais concreto disso é o nosso padrão de beleza eurocêntrico. Mesmo após mais da metade da população brasileira ser reconhecidamente negra, ainda acreditamos que a beleza de alguém é diretamente proporcional ao quanto se encaixa nos padrões eurocêntricos. A preferência nacional ainda é pelas loiras, mesmo entre os homens negros, assim como boa parte das mulheres negras prefere se relacionar com homens brancos.

O racismo está implícito e faz com que milhares de pessoas negras, pardas, miscigenadas e lindas cresçam achando que são inferiores. Nas famílias onde não há uma forte identidade negra para fazer nascer o orgulho pelas origens e a aceitação, os miscigenados se acham menos bonitos do que seus irmãos que nasceram um pouco mais branquinhos. As meninas crescem achando que têm cabelo ruim, e acabam fazendo com que seus cabelos fiquem ruins mesmo de tanta química para tentar alisá-los. Não que seja errado alguém que queira alisar os cabelos ou quem prefira pessoas com determinadas características físicas, mas não vamos tapar nossos olhos e tentar acreditar que boa parte dessas “preferências” interioriza inconscientemente um histórico de racismo.

Se para as mulheres existe essa cobrança para se adequarem cada vez mais aos padrões excludentes, os meninos também não escapam: estão acostumados a serem trocados por outros brancos ou loiros, que sempre têm muito mais mulheres dispostas a relacionamentos e amizade, e as meninas a quase sempre serem a segunda opção na disputa com uma amiga igualmente bonita, mas branca. Os meninos negros estão acostumados a serem revistados pela polícia, enquanto seus amigos brancos não levantam muitas suspeitas. O branco encontrado com maconha no bolso da calça é vagabundo, filhinho de papai e mimado, o negro é bandido, marginal.

Tento pensar que o Brasil está mudando. Todos os dias, ao menos em São Paulo, vejo mulheres lindas assumindo seus cabelos crespos ou cacheados e homens ganhando auto-estima e orgulho por sua cor e miscigenação. E sonho todos os dias em ver cada vez mais pessoas ignorando imposições absurdas e inatingíveis, e sendo felizes se aceitando como elas são. Bonitas ou não. Capas de revista ou não.

Livrem-me da neocaretice e da falta de personalidade existente nesse planeta, amém!

Estamos tão habituados a viver no nosso universo particular ao lado de amigos e frequentando ambientes onde todos pensam como nós, que, ao sairmos dessa nossa bolha ideal, tomamos um susto! Nem todos pensam como nós e lá fora ainda existe um mar de preconceito e uma quantidade enorme de gente alienada, arcaica, que tenta impor sobre nós suas regras e verdades inquestionáveis acerca da vida, da moralidade, quase literalmente cagando regras de como devemos pensar e agir!

Essa gente me faz pensar que os preconceitos e essa repressão silenciosa crescem à medida em que avançamos nas questões de direitos sociais e liberdades individuais. Eles ainda acham válido que gays sejam espancados e discriminados para que se tornem “homens de verdade” e que a estes sejam negados direitos sociais primordiais em nome de uma duvidosa vontade divina! Também acham que devemos educar nossas crianças e adolescentes à base de pancadas, para que aprendam desde cedo a se defenderem da vida. Já vi muitos deles afirmarem que bons tempos eram o da ditadura, que jovens só deturpam a sociedade e que deveríamos restringir o uso dos computadores para menores de idade! Parece mentira, mas não é! Esses cidadãos se esforçam para tapar o sol com a peneira, defendendo proibições e ideais absurdos como se eles fossem capazes de solucionar questões muito mais complexas.

São as mesmas que, de forma sutil, insistem em achar estranho que alguém coma uma comida diferente, que vista uma roupa que não está na moda, que se sinta bem sendo quem é, gordo, magro, alto, baixo, que tenha outras concepções de certo, errado, moral, imoral, feio, bonito, e que não se sujeite totalmente às regras que elas entendem como determinadoras do bom caratismo de alguém!

Que elas livrem a todos nós dessa neocaretice!  Nossas ruas ficam mais bonitas quando há diversidade e nossa vida fica mais feliz quando não precisamos julgar todos a todo momento. Que elas nos livrem dessa falta de personalidade, porque não seríamos plenos se  obrigássemos pessoas a serem o que não são em nome do que entendemos por moral, e porque temos consciência de que atentar à liberdade de alguém desse modo, é ferir a nossa própria liberdade de sermos quem somos, amar quem quer que amemos e viver como vivemos.

Que tenhamos a paz de um dia viver em nossos mundos ideais sem nos trancarmos em mundos imaginários!

Trecho de Caio Fernando Abreu:

” (…) Saí do cinema pensando: é preciso estar atento e forte, colega, a Idade Média está de volta. Discretamente, todo dia, de muitas formas estamos sendo bombardeados por mensagens tipo: não saia da linha, não cometa nenhuma transgressão, não se apaixone. Caso contrário, você será punido por isso. O vírus da Aids materializou nas cabeças burras aquela velha suspeita de que toda a nudez, um dia, seria inevitavelmente castigada. O que confirma a culposa lenga-lenga judaico-cristã de que este planeta não passa mesmo de um sofrido vale de lágrimas, onde todo prazer é sinônimo pecado. Para quem acompanhou a luta das minorias nos anos 60 e 70, resta um espanto no ar: o que está acontecendo? É um retrocesso? Foi tudo inútil? Como se entrássemos coletivamente numa máquina do tempo moral e mental, para negar a História e ignorar todos aqueles vislumbres de felicidade individual conquistados nas últimas décadas. Tentar ser feliz agora, saindo fora do esquema, é crime. Homossexuais, mulheres independentes, homens descasados, rebeldes de todo tipo, artistas, loucos mansos e varridos: a nova moral está no seu encalço.

A neocaretice está solta pelas ruas. Ela mora no apartamento ao lado, na casa da esquina e anda muito preocupada com a possibilidade de Jocasta e Édipo consumarem seu colorido incesto às oito da noite. Ela quer que o sexo que não se destine exclusivamente à procriação seja varrido da face da Terra. Ela sorri amável no elevador, dá bons-dias, boas-tardes, boas-noites, depois fica prestando atenção na sua vida para ver se você está andando direitinho dentro da linha. E se não estiver, tome cuidado, porque de alguma forma você pode ser punido. Despejo, desemprego – você sabe, essas pequenas tragédias que acontecem com quem ainda é capaz de não só acreditar em um pouco de prazer, mas até de lutar por isso. Embora, concordo, ninguém saiba mais direito o que seria “o prazer” a estas alturas da década de 80.
Quanto a nós, meio gauches, meio bandidos, dinossauros sobreviventes daquele tempo em que tudo parecia que ia mudar – não resta muito mais a fazer senão resistir. Movidos, no mínimo, pela curiosidade de onde vai dar tudo isso. E sempre se pode cantarolar baixinho aquele velho blues (Milagres) de Cazuza, que diz assim: “Mas que tempo mais vagabundo é esse que escolheram pra gente viver?”. Caio Fernando Abreu – 20 janeiro de 1988

Artistas e Músicas do meu Fim de Semana

O título do último post aqui do blog é “VISCERAL E PONTO”. “Visceral” é uma palavra que pode resumir o meu jeito de sentir e pensar sobre as coisas: Ou é ou não é, ou toca ou não toca! Cansada de estudar, passei o final de semana quase inteiro ouvindo músicas e descobri que de alguma forma, todas elas se uniam pela visceralidade.

Charles Bradley – É um cantor americano, nascido na Florida, que faz Soul, Jazz, Funk, R&b, tudo com altíssima qualidade! Em 2011 ele lançou um disco chamado “No Time For Dreaming”, o qual eu não consigo parar de ouvir!

 

Mariana Volker – Conheci a Mariana Volker, carioca na MTV alguns anos atrás, vendo a banda Unidade Imaginária, da qual ela é/era vocalista, tocar. Ainda gosto da banda, que não se ainda existe ou já acabou. Me encantei com essa versão de Todo Amor que Houver Nessa Vida que ela fez tocando piano.

 

5 a Seco – Conheci a banda de um jeito engraçado: fui a um show deles com participação da Tiê pensando que o show era apenas da Tiê, e o resultado foi que me encantei pela banda! É um sopro de vida e criatividade para a música popular do cenário paulista! Quem gosta do Lenine, certamente irá gostar do som deles!

 

 

Mallu Magalhães – Já falei da Mallu em outro post, e pois é, ainda não consegui parar de ouvir o disco dela. A música da vez é “Cena”, me identifico dos pés à cabeça, o som é uma delícia!

 

Etta James – Fazia tempo que eu não ouvia, e estava com saudade do exagero, da comoção que ela me proporciona. Como ela, jamais haverá cantora igual! Ela morreu esse ano, mas faz parte daquela liga de artistas cuja sinceridade fará com que sejam eternos.

Sessão Pipoca: Filmes da Semana

Mesmo com pouco tempo não consigo deixar o vício pelos filmes de lado! Me deixem sem livros, sem chocolate, sem cappuccinos, mas não me deixem muito tempo sem ver um bom filme!

Tomates Verdes Fritos (1991) – Eu sempre via as pessoas comentarem, até que essa semana resolvi ir atrás do filme. O resultado foi que eu amei e o filme acabou entrando na minha lista de preferidos. Além de um roteiro incrível, a trama é boa porque faz reflexões incríveis sobre a vida, o envelhecimento, a coragem e a morte, tanto que acabei com um trecho escrito por Charles Bukowski na cabeça:

“O que é terrível não é a morte, mas as vidas que as pessoas levam ou não levam até a sua morte. Não reverenciam suas próprias vidas, mijam em suas vidas. (…) A maioria das mortes das pessoas é uma empulhação. Não sobra nada para morrer.”

Elena Undone (2010) – Um filme, mais uma vez, para pessoas de mente aberta, pois se trata de uma história de amor entre duas mulheres: Peyton, uma lésbica  assumida e Elena, uma mãe de família casada com um pastor evangélico. Além da história muito bem abordada, o filme também fala sobre amores verdadeiros de toda forma e faz pensar em destinos e almas gêmeas. Enquanto Peyton tenta inibir seus sentimentos, Elena mostra coragem para ir adiante com seus sentimentos. É um filme belíssimo, que marca sem dúvidas a história do cinema, por ser tão corajoso! Trailer aqui.

Mallu Magalhães: Mais Velha e Mais Louca

Me perdoem pela piadinha impensada do título, mas eu realmente acredito que o último CD da Mallu Magalhães nos trouxe essa certeza de que ela cresceu e está muito mais madura musicalmente falando! Sempre gostei da música e do fato dela ter começado a carreira bem menina, disponibilizando música através do My Space e, mesmo sendo tímida, ter saído tocando por aí quando começou a obter retorno. E sempre torci para que ela lançasse coisas novas que me tocassem como algumas músicas fizeram no início da carreira. A influência do Marcelo Camelo fez bem pra ela!

Achei o clipe de Velha e Louca de uma beleza ímpar. Tanto letra quanto música são espetaculares e a Mallu está linda no clipe, perdeu o ar de adolescente e se desprendeu de algumas neuras! A transição do Folk para a música essencialmente brasileira caiu muito bem à Mallu! Não consigo mais parar de ouvir o disco, acho que o descobrimento da liberdade e da força pessoal dela estão condizendo comigo!

O clipe de Sambinha Bom também é incrível, tanto em termo de linguagem quanto em fotografia:

Não consigo parar de ouvir: John Mayer e Carla Bruni

Há algumas semanas, resolvi reativar meu tumblr e escolhi um novo tema para ele: amor. Não apenas o amor romântico, mas também o amor carnal e, preparando a playlist que começa a tocar automaticamente assim que o blog abre, adquiri alguns vícios musicais novos.

O primeiro é o John Mayer, que já conheço há bastante tempo. Seu primeiro disco foi lançado em 2001 e desde então ele está aí nas paradas, arrasando o coração de muitas mulheres e esquentando o clima de outras. Seus principais sucessos são Daugthers, Your Body is a Wonderland, Why Geoergia, Neon, Waiting on the World to Chance, entre outras.

Carla Bruni é mais conhecida por ser modelo, atriz e casada com o ex-presidente da França, Nicolas Sarkozy. Mas o que interessa aqui é o talento musical da moça, que tem canções em Inglês e Francês igualmente incríveis. A mais conhecida, sem dúvida alguma, é Quelqu’un m’a ditnome também de seu primeiro disco, lançado em 2003. Depois dele, foram lançados mais dois discos: No Promises (2007) e 

Em inglês, Those Dancing Days Are Gone (o clipe é lindo e ela está muito bonita nele – aliás, ela nunca está feia!)

Alain de Botton e Religião Para Ateus

Estou lendo um livro muito curioso, que ora me irrita ora me leva a conclusões muito interessantes: “Religião para Ateus”, do inglês Alain de Botton. Não sou ateia, ainda tenho minhas dúvidas e minhas crenças. Já falei isso em outro post, mas o livro anda me deixando tão intrigada que resolvi falar novamente!

Alain de Botton afirma em seu livro que apesar dos ateus – categoria na qual ele mesmo se inclui – não acreditarem na existência de Deus, é possível encontrar aspectos positivos nas religiões que levam as pessoas a lidarem melhor com a vida secular. Segundo ele, o fato de não crer em Deus não elimina as nossas principais questões existenciais como “o sentido da vida”, “a morte”, “a solidão” e que, nesse ponto, as religiões possuem meios de confortar em indicar bons caminhos até mesmo àqueles que não possuem nenhuma fé. Não há como discordar disso, pois, se não cremos em Deus, estamos ao mesmo tempo livres e jogados à nossa própria sorte, o que pode ser positivo para uns e muito danoso para outros.

Porém, há uma grande diferença entre ter conhecimento espiritual (conhecimento dos ensinamentos e valores religiosos) e ser uma pessoa espiritualizada (aplicar esses valores que remetem à bondade e ao bem, e que nem sempre são adquiridos através da religião), e é essa a questão: nem todo mundo que possui uma religião é espiritualizado e há pessoas que mesmo sem religião são muito espiritualizadas.

Será que o problema do mundo e dos ateus é mesmo a falta de valores religiosos para guiar todos a uma vida moral e digna?

Eu acredito que não: “o buraco é bem mais embaixo”! Precisamos de educação e entender que os princípios básicos de fé e não-fé são muito pessoais, não devendo ser aplicados a todos. Por melhores que sejam as intenções do livro e de tantos ensinamentos religiosos, ainda acredito que tudo seja questão de caráter e consciência, não de quem possui ou não valores religiosos em seus princípios.

Afinal, o que é ser feminista?

Defender o feminismo se confunde o tempo todo com o ato de declarar uma guerra, afinal, como são chatas e extremistas essas feministas! Não entendem uma piada! Quem elas pensam que são para acharem que podem dar sua opinião sem serem questionadas? E compreendo a dificuldade que as pessoas têm de entender o feminismo porque não existe uma lista de atributos que enquadram ou excluem alguém do rótulo de feminista. Além disso, enquanto vindas de pessoas diferentes, com vidas e interesses muitas vezes opostos, as reivindicações feministas variam muito. A prova disso é a existência de vertentes totalmente contrárias dentro do feminismo que nunca entrarão em acordo.

O feminismo é uma luta de gênero que age pela igualdade, pelo fim da discriminação sexual, pela equidade de direitos, o que é completamente diferente de lutar para extinguir direitos alheios ou querer privilégios! Mas as pessoas distorcem, infelizmente. E o caso mais batido – vou começar a chover no molhado aqui – é quando se referem à Marcha das Vadias! Não sei qual o motivo de tamanha dificuldade para entender, talvez a ironia do termo “vadia” para nomear o movimento e a preguiça de dar uma boa pesquisada antes de sair afirmando coisas, sejam alguns dos responsáveis por tantas más interpretações acerca do protesto.

Usar o termo vadia de forma irônica, como foi feito na marcha, é apenas um meio de expressar que nenhuma mulher deve ser discriminada por querer ser livre. Uma forma de expressar tamanha frustração por ainda hoje termos uma convenção social que faz acreditar que mulher tem que casar, cuidar de filho, que quando dá opinião demais é porque está sem louça suja na pia! Se fugir da regra do que é uma mulher respeitosa, decente e para casar, é obrigatoriamente taxada de puta! E pra afirmar que se nos chamam de vadias porque não agimos conforme as regras, vamos continuar sendo vadias e isso não nos tira o direito de sermos respeitadas.

Mas aí afirmam: fazem uma Marcha das Vadias para dizer que querem ser respeitadas pelo fato de quererem “dar” pra todo mundo, sair pegando geral e mostrar os peitos na rua! E quando afirmo que as pessoas não se coçam pra fazer uma pesquisa sobre o que motiva esse tipo de protesto, estou sendo uma feminista chata e hipócrita. Primeiro: se uma mulher quer fazer sexo com 902802 homens, problema dela! Segundo: se fosse um homem que quisesse transar com 1 milhão de mulheres e conseguisse, ia ter quem aplaudisse. Querem ditar regra sobre o que as mulheres podem ou não podem fazer com o próprio corpo, e elas que não questionem, claro! Mas, sinceramente, apenas uma pessoa muito babaca vai às ruas lutando exclusivamente para ser respeitada por “pegar geral”, né? Falta o mínimo de bom-senso aos que pensam e afirmam que essa é a reivindicação mor do feminismo!

O real motivo das mulheres estarem saindo às ruas, muitas mostrando sim os seios, foi uma forma de se posicionarem contra a erotização do corpo feminino. A Marcha das Vadias surgiu após um segurança canadense dar uma palestra em uma universidade afirmando que para evitar que os estupros aconteçam as mulheres precisam parar de se vestir como vadias (sluts – daí o nome original “Slut Walk”) – eu avisei que ia chover no molhado! Ou seja, é pertinente se manifestar contra a erotização do corpo feminino (considero aqui a possibilidade de haver quem não concorda com a forma utilizada para protestar, mas em um país onde sair pelada no carnaval e na playboy são coisas hiper aceitas, acho de um moralismo e de uma hipocrisia sem tamanho não poder ficar pelada para protestar), principalmente em uma sociedade em que temos o costume de atribuir a culpa de um estupro sempre à vítima. Não é raro ouvir que se uma mulher estava bêbada, vestindo pouca roupa, andando sozinha durante a noite “estava pedindo para ser estuprada” ou “facilitou”! E afirmar isso reduz a culpa do estuprador! Qual a menina que nunca se sentiu mal por usar uma roupa curta, ter sido cantada na rua das formas mais ridículas possíveis e ficou achando que valia a pena passar um pouco mais de calor? Protestar mostrando os seios, usando roupas curtas, é uma maneira de dizer que a forma como nos vestimos ou nossa conduta não dá a ninguém o direito de invadir o nosso corpo! Usar roupas curtas ou não, não faz ninguém menos merecedor de respeito!

Eu estaria muito satisfeita se as confusões com as motivações por trás da Marcha das Vadias fossem a única causa que gera tanto conflito entre as feministas e o resto do mundo. Mas não. Ainda há quem afirme que as feministas são chatas por fazerem tempestade em copo d’água; essas pessoas devem ignorar todas as estatísticas já que acham que a existência de uma lei que puna a violência contra a mulher é garantia de que o problema está com seus dias contados e se esquecem de que nessa questão há um problema social muito grave: a crença de que a mulher pertence ao homem e deve respeitá-lo sob qualquer outro aspecto! Há quem afirme que a culpa por as mulheres estarem tão insatisfeitas com a tripla jornada de trabalho seja do feminismo; essas mesmas pessoas também são incapazes de questionar os padrões que eximem o homem da responsabilidade de cuidar da casa e dos filhos. Fora os inúmeros lugares comuns que vivem afirmando que mulher não sabe dirigir, que mulher “tem que ter onde pegar”, que homem depende da mulher por ser incapaz de lavar uma louça, fazer comida e que mulher é que nasceu pra isso. A opinião de uma mulher é chamada de TPM! No fim, acabo concluindo que essas pessoas não fazem ideia do quão reacionárias e levianas acabam sendo!

Não há uma cartilha que exponha todas as causas que fazem parte do rol de reivindicações feministas ou que dite quais os comportamentos a serem seguidos pelas feministas. Mas ser feminista é questionar padrões, estruturas e verdades aparentemente inquestionáveis. As feministas não são gordas ogras e peludas, mal amadas que só conseguem homens sendo vulgares objetos sexuais, ou que obrigatoriamente são lésbicas e pior, mulheres de modo geral, que odeiam os homens (a isso damos o nome de misandria). Não é preciso abolir a depilação e nem a chapinha ou crucificar a instituição do casamento para se enquadrar no feminismo, apenas respeitar sua essência pessoal a ponto de não ser escravizado por padrões inatingíveis da perfeição feminina.

“Que nada nos defina. Que nada nos sujeite. Que a liberdade seja a nossa própria substância.” Simone de Beauvoir

Descriminalizar o Aborto ou dar Amparo às mães?

Assunto ampla e calorosamente discutido por leigos, feministas e religiosos, a descriminalização do aborto ainda é um tema que carrega consigo muitos pontos polêmicos, que, por vezes, dificultam o seu entendimento e conversas no mínimo civilizadas sobre o assunto. Do ponto de vista de alguns especialistas e feministas, a sua descriminalização nada mais é do que regulamentar o direito que a mulher deve ter de tomar decisões que digam respeito a seu próprio corpo, levando em consideração os parâmetros científicos que afirmam que a vida inicia-se após a  oitava semana de gestação. Já para os religiosos, não há meio termo, sendo o aborto para eles um desrespeito à vida.

Muito discute-se acerca dessas questões, porém pouco fala-se a respeito de que medidas poderiam ser tomadas com maior eficácia para evitar que mulheres engravidem sem desejar e para garantir o apoio àquelas que optam por ter seus filhos. Já é batido falar da educação sexual, do planejamento familiar, mas e quando as duas coisas falham e a mulher opta por ter a criança?

A nova piada do país é o auxílio pré-natal, no qual o governo disponibiliza uma quantia de míseros R$50,00 –  pagos em duas parcelas! – para que as gestantes que fazem acompanhamento pelo SUS possam se deslocar até os hospitais. Melhor do que nada, mas será que essa contribuição ainda não é muito pequena se comparada à contribuição que uma mãe dá a sociedade? E mais: e quanto ao amparo que deveria ser dado às mesmas após o nascimento, que é onde o desafio começa de fato?

Por questões de mudanças na estrutura das famílias, hoje, a tarefa de ser mãe se tornou muito mais complicada e exige muito mais da mulher, que, no momento em que se torna mãe, apenas sofre um acúmulo de tarefas: trabalha, é dona-de-casa, estuda e ainda precisa tomar conta de seus rebentos. É justo que o governo dê amparo a essas mulheres, prolongando o período de licença maternidade, criando mais e melhores creches e berçários, mantendo hospitais capazes de dar auxílio às mães nos primeiros meses de vida da criança, melhorando a educação das escolas públicas e, principalmente, não tratando a mulher como se suas dificuldades fossem iguais as dos homens, porque não são.

Se questões culturais e burocráticas ainda nos impedem de descriminalizar o aborto, por que não trabalhar para evitar que este se faça necessário?

Tirem seus padrões do meu corpo

De tempos em tempos surge alguma polêmica envolvendo machismo e feminismo que gera discussões imensas na internet. As meninas acusam os rapazes de fazerem piadinhas infames reduzindo sua condição de mulheres e dizem que eles usam a palavra “mulherzinha” como xingamento, tratando-se de ofensa ao gênero. Do outro lado, os rapazes afirmam que a graça do humor está no politicamente incorreto e que isso não é machismo coisíssima nenhuma. Basta uma pronunciação em 140 caracteres e a guerra está declarada!

Embora muita gente tente tapar o sol com a peneira, é inegável que vivemos em uma sociedade machista, que cultua o estupro (veja definição de estupro aqui se você acha exagero) e ficar me atendo a isso só levaria esse texto a ser idêntico aos milhares de textos feministas que circulam por aí – não os desmerecendo. A questão é: será que temos dimensão do quanto esse problema nos afeta?

Hoje, para ser socialmente aceita, a mulher precisa ter peito, bunda, cintura esbelta e fazer depilação à cera! Coitada da que não estiver em dia com a depilação, afinal, que nojo ter pelos! Se outrora os padrões eram outros e permitia-se alguns quilos e pelos a mais, a evolução da moda e dos padrões está nos levando a um retrocesso enorme chamado de caretice! É feio ser diferente! Estamos fabricando garotas cada vez mais inseguras que baseiam suas vidas e auto-estima nesses padrões e, por conta deles, acabam levadas a quadros depressivos, distúrbios alimentares e, muitas vezes, à morte! Mulheres que perdem um dos bens mais precisos que poderiam ter: o amor próprio, e são levadas diariamente a se sentirem péssimas por não se parecerem com beldades, com quilos de photoshop nas nádegas, ditando regras em capas de revistas feitas para satisfazer o gosto masculino.

Elas fazem de tudo para se adequar, de dietas malucas a procedimentos cirúrgicos dolorosíssimos. Dentre as cirurgias plásticas que mais estão em alta, o implante de próteses de silicone para os seios é o líder no Brasil, seguido da lipoaspiração e das plásticas de rosto. E não é que já existe até plástica íntima?

Penso que um dos papeis mais importantes do feminismo é levar as mulheres a aceitarem o próprio corpo e respeitarem a si mesmas. Nascemos um país miscigenado, nada mais natural que cada mulher possa ser bonita de sua maneira. Branca, Parda, Oriental, Negra, mulher-não-capa-de-revista!

Essa é uma tarefa árdua, principalmente quando percebemos que mesmo em manifestações incríveis como a Marcha das Vadias (não entende ou acha que as meninas que participam querem apenas mostrar os seios, leia esse texto explicativo), em que os protestos agem no sentido de liberar o corpo feminino dos padrões machistas, há quem veja as fotos para dizer que gorda não pode sair pelada, se sentir bem consigo mesma, que peito não pode ser caído, que mulher de verdade precisa ter seios como os de qualquer mulher-objeto por aí, etc.. E, muito embora façamos trabalho de formiguinha, ainda acredito que num futuro não tão distante, vamos chegar ao nível evolutivo de respeitar as diferenças e nos livrar dessa massificação horrível de peitos, bundas e cérebros. Que o feminismo seja usado menos para causar polêmica e mais para ajudar na construção de uma nova identidade feminina, livre de padrões doentios e limitadores.

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Acho engraçado: mostrar peito e bunda no carnaval e na playboy as mulheres podem, né?

Sessão Pipoca: Do Começo ao Fim

Consumida pelas séries e pelos livros, há tempos eu não reservava lugar para um bom filme! O da vez é um nacional: Do Começo ao Fim. Só consigo me perguntar por que demorei tanto para assisti-lo!

Simplesmente amei o filme, tanto que não quis que acabasse tão rápido! Cheio de atuações incríveis e atores que se encaixaram perfeitamente nos papéis. A fotografia e trilha sonora impecáveis fazem perfeitamente possível sentir a emoção dos personagens na própria pele. É, entretanto, um filme para quem é livre de preconceitos – ou quem sabe, para desfazer preconceitos – já que conta uma história de amor entre dois rapazes com uma abordagem bastante corajosa por se tratar de um filme nacional. Quem não viu, veja!